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O arcebispo argentino Dom Víctor Manuel Fernández O arcebispo argentino Dom Víctor Manuel Fernández

Dom Fernández: “Uma Pessoa nos salva, não uma doutrina"

Entrevista com o Arcebispo argentino de La Plata, Dom Víctor Manuel Fernández, que o Papa Francisco nomeou como novo Prefeito do Dicastério para a Doutrina da Fé: "Manter a fé certamente não exclui a vigilância; a fé pode ser salvaguardada sobretudo com o aumento da sua compreensão".

ANDREA TORNIELLI

Uma teologia que cresça e se aprofunde “no diálogo entre os teólogos e no entendimento com as ciências e a sociedade”. Mas sempre a serviço da evangelização. O Arcebispo de La Plata, Dom Víctor Manuel Fernández, considera que seja esta a tarefa que Francisco lhe confiou, como emerge da carta que o Bispo de Roma lhe enviou com sua nomeação para prefeito do Dicastério para a Doutrinada Fé. Dom Fernández é um estreito colaborador do Papa Bergoglio desde quando era arcebispo de Buenos Aires. Em uma conversa com a mídia vaticana, o novo Prefeito, que assume o cargo no próximo mês de setembro, fala sobre o significado de anunciar o Evangelho e manter a fé em nossos dias.

Dom Víctor, por que o Papa acompanhou a sua nomeação com uma carta? Qual seu significado?

“Sem dúvida, isso tem um significado importante. O Papa disse que, com o decreto de nomeação, ia me enviar uma carta para esclarecer o significado da minha missão. Nela, ele destaca pelo menos seis pontos fortes que me convidam à reflexão; mas, no meu parecer, acho que, com o seu conteúdo, ele quis de alguma forma  antecipar a aplicação da Constituição Apostólica ‘Praedicate Evangelium’. De fato, insiste para a Teologia possa amadurecer, crescer e se aprofundar no diálogo com os teólogos e no entendimento com a ciência e a sociedade. Mas tudo isso sempre a serviço da evangelização. Ele já havia transmitido esta mensagem ao colocar este Dicastério logo depois do da Evangelização. Porém, com a sua Carta, Francisco a torna ainda mais explícita; aliás, ele a confirma de modo mais evidente com a escolha de um teólogo e pároco como novo Prefeito Dicastério da Doutrina da Fé”.

O que significa hoje "manter" a fé?

“Francisco explica que a expressão 'manter a fé' é rica de significados. Certamente, não exclui a vigilância, mas afirma que a Doutrina da Fé deve ser salvaguardada, sobretudo, com o aumento da sua compreensão. Também uma situação, ao ter que enfrentar uma possível heresia, deveria contribuir para um novo desenvolvimento teológico, que leve a amadurecer a compreensão da doutrina: eis a melhor maneira de manter a fé! Se o Jansenismo, por exemplo, pôde persistir por tanto tempo, é porque houve apenas condenações, sem dar nenhuma resposta a certas intenções legítimas, que poderiam se ocultar atrás dos erros, e sem nenhum desenvolvimento teológico adequado na época”.

Como anunciar o Evangelho e transmitir a fé em contextos cada vez mais secularizados das nossas sociedades?

“Buscando mostrar sempre e melhor toda a beleza e atração da mensagem evangélica, sem a desfigurar e contagiar com critérios mundanos; deve-se sempre encontrar um ponto de contato, que a permita ser verdadeiramente significativa, eloquente, preciosa para quem a recebe. Sem o diálogo com a cultura, corremos o risco de tornar a nossa mensagem irrelevante, por mais bela que seja. Por isso, sou muito grato pelo tempo que passei como membro do Pontifício Conselho para a Cultura, onde pude conhecer, mais profundamente, o coração do Cardeal Gianfranco Ravasi”.

Qual o significado e a atualidade das palavras de Bento XVI no prólogo da sua encíclica Deus caritas est: "O início do ser cristão não parte de uma decisão ética ou de uma grande doutrina, mas do encontro com um acontecimento, com uma Pessoa, que dá origem a um novo horizonte e, com ele, a direção decisiva”?

“É muito oportuno recordar estas palavras em nossos dias. Nenhuma doutrina religiosa mudou o mundo, a não ser mediante um acontecimento de fé, um encontro que dá uma nova orientação à vida. Isso não vale apenas para o cristianismo, mas pode ser constatado na história das religiões, como, por exemplo, a crise do hinduísmo e sua posterior renovação com os hinos a Krishna e em tantas outras ocasiões. Sem a experiência do Cristo vivo, que ama e salva, não podemos moldar nosso ‘ser cristão’; brigar ou discutir com todos não ajuda a amadurecer seu desenvolvimento nas pessoas. Esta frase de Bento XVI convida-nos a desenvolver uma teologia sólida e bem consolidada, cada vez mais orientada a esta finalidade”.

 

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08 julho 2023, 13:00