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Imagem de Nossa Senhora da Uva na Igreja de São Gotardo,  em Flores da Cunha, RS (Foto: Bárbara Sandi) Imagem de Nossa Senhora da Uva na Igreja de São Gotardo, em Flores da Cunha, RS (Foto: Bárbara Sandi) 

Católicos fazem procissões pedindo chuva para o Rio Grande do Sul

Segunda grande estiagem em menos de um ano têm causado inúmeros prejuízos para a agricultura e a pecuária local, que servem de subsistência para dezenas de famílias gaúchas.

Filipe Brogliatto - Vatican News

A falta de chuva dos últimos meses tem deixado a população do Rio Grande do Sul aflita. Castigados pela segunda estiagem no ano e que afeta praticamente todo o Estado, agricultores e pecuaristas depositam na fé, toda sua esperança neste período de dificuldades. Não faltam velas acesas, terços, santinhos, além outros objetos de devoção nas mãos do povo. Povo este, formado por homens e mulheres de todas as idades, desde o bebê de colo até o vovô e a vovó. Povo que reza e canta unido, faz procissão e promessa implorando por chuva. O pedido parece simples, mas é muito significativo: que a água possa novamente banhar o solo e dar vida nova às plantações.

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Comunidades paroquiais voltaram a realizar procissões, caminhadas, novenas e outras celebrações para pedir chuva. Da mesma forma, antigas tradições que brotam do seio da fé católica local, também estão ocorrendo. Uma delas, muito significativa culturalmente falando, é a de – literalmente – tirar a imagem do Santo Padroeiro do lugar, confiando que assim a chuva virá. Ninguém sabe de onde e porque surgiu essa tradição. O certo é que muitas vezes a chuva caiu sobre a terra e fez a semente germinar, reanimando os produtores. Esse ato religioso, é um costume típico, que passa de geração a geração no Estado do extremo sul do Brasil.

Uma dessas procissões ocorreu na quarta-feira (29/12), na cidade de Caxias do Sul, na Serra gaúcha. Dezenas de moradores do distrito de Santa Lúcia do Piaí, no interior da segunda maior cidade do Estado, se reuniram para uma procissão a pé de cerca de cinco quilômetros. A peregrinação noturna moveu a imagem de Nossa Senhora do Rosário. Os fiéis saíram da capela da Linha Paese, onde está colocada a imagem de Maria e seguiram até a igreja de Santa Lúcia do Piaí, onde foi celebrada uma missa votiva nas intenções da comunidade.

Outra ação semelhante ocorreu na cidade vizinha. Em Flores da Cunha, desde setembro do ano passado, uma imagem de Nossa Senhora da Uva tem percorrido nestes dias as 34 comunidades da paróquia. A visita da estátua estava programada desde os primeiros meses de 2021, mas ganhou um aspecto mais especial neste período de seca: a benção da Mãe de Jesus sobre os produtores e a produção. Flores da Cunha é a cidade que mais produz uvas e vinhos no Brasil. Por isso, grande parte da economia provém da agricultura e a falta de chuva ameaça a safra de 2022 que se aproxima.

Fiéis rezam sob o olhar de Nossa Senhora da Uva
Fiéis rezam sob o olhar de Nossa Senhora da Uva

Nossa Senhora da Uva

A devoção a Nossa Senhora da Uva não é muito difundida, mas é devidamente reconhecida pela Igreja Católica. Essa denominação de Nossa Senhora era venerada na França e posteriormente em regiões da Itália, de onde vieram os imigrantes que povoaram a Serra gaúcha. Nos anos de 1990, padre Homero Rossi, que era vigário do distrito Otávio Rocha, em Flores da Cunha, ganhou um quadro que retratava a Virgem Maria com o Menino Jesus no colo e segurando um cacho de uva. Em 2010, uma estátua de 2 metros de altura foi colocada na praça do distrito, onde se encontra para a veneração dos fiéis.

Já a imagem de madeira, que fora confeccionada em 2020 para “ser peregrina” na cidade, possuí cerca de um metro de altura e foi adquirida pela Paróquia Nossa Senhora de Lourdes. Foi no ano passado que a réplica passou a circular pela cidade de 30 mil habitantes, provocando muitas demonstrações de fé. De acordo com os freis Capuchinhos que administram a paróquia, a ideia é que se mantenham ao longo dos anos, as atividades entorno dessa recente devoção a esse título de Maria. 

A festa de Nossa Senhora da Uva ocorre no dia 24 de setembro na Europa, época em que se verifica a colheita da uva no Velho Continente. Há a intenção de estabelecer o Dia de Nossa Senhora da Uva no calendário oficial de Flores da Cunha. Mas, por enquanto, o projeto ainda não foi adiante. Por isso a mesma data foi acolhida na cidade. Flores da Cunha é considerada o berço da devoção no Brasil e também na América Latina.

Momento da bênção na Igreja de São Gotardo, em Flores da Cunha (Foto: Bárbara Sandi)
Momento da bênção na Igreja de São Gotardo, em Flores da Cunha (Foto: Bárbara Sandi)

Estiagem no Rio Grande do Sul

Sem chuvas significativas há semanas, muitas áreas do território gaúcho estão literalmente secas. A produção de soja, por exemplo, que ocupa milhares de hectares, é uma das mais prejudicadas. Alguns produtores chegaram a plantar as sementes, mas, muitos tiveram prejuízo próximo de 100%, pois sequer houve a geminação. Os agricultores da Serra gaúcha que produzem uvas, viram seus parreirais secarem e a fruta, que está há poucos dias da fase final da maturação, murchar. Nas áreas de criação de gado, existe outro grande desafio: muitos açudes secaram. Com isso, produtores se viram obrigados a dar água para o rebanho através de caminhões pipa, para que os animais não morram de sede ou fiquem doentes pela desidratação. Produções de outros cereais como o milho, legumes, frutas e a criação de animais para abate ou cultura do leite, também são afetadas.  

Até o domingo (02/01), pelo menos 96 municípios do Rio Grande do Sul já haviam decretado situação de emergência. A lista, que conta com 19% das 497 cidades gaúchas, pode aumentar ainda mais ao longo desta primeira semana de 2022. Prefeitos de todas as regiões estão preparando decretos em busca de ajuda governamental para minimizar os prejuízos. Na região noroeste, por exemplo, as perdas devido à estiagem já ultrapassam R$ 1 bilhão. Esses recursos que “escorreram pelo ralo” por conta da falta de chuva, impactam diretamente na rotina de famílias que dependem do campo para sobreviver.   

 

Previsão de chuva

A chuva pode retornar ao Rio Grande do Sul nesta semana. De acordo com um boletim elaborado pela Secretaria Estadual de Agricultura, Pecuária e Desenvolvimento, uma frente fria deve atingir o Rio Grande do Sul na terça (04/01) e quarta-feira (05/01). 

Ao todo, serão dois tipos de circulação que podem favorecer a formação de nuvens de chuva. O primeiro será um fluxo de calor e umidade transportado pela corrente de jato de baixos níveis, que chegou ao Estado ainda na quinta-feira passada (30/12) e trouxe ar quente e úmido da região Centro-oeste do Brasil. Essa circulação pode auxiliar na formação de pequenos sistemas de aglomerados de nuvens e gerar chuvas nas regiões Noroeste, Norte e Nordeste do Estado.

O segundo sistema previsto pelos modelos numéricos será uma frente fria, que deverá chegar ao Rio Grande do Sul nesta terça-feira e permanecer atuando durante toda a quarta-feira. Caso esta frente fria realmente chegue ao Estado, os modelos indicam chuvas acumuladas de mais de 30 milímetros para a região Nordeste e acumulados maiores do que 20 mm para as regiões do Litoral e Central.

Fortes chuvas em outros locais

Enquanto uns sofrem com a falta de chuva, outros ficam desabrigados pelo excesso de água. O estado da Bahia, por exemplo, foi atingido por fortes temporais na semana passada, que deixaram milhares de pessoas desabrigadas.

Em balanço divulgado pela Superintendência de Proteção e Defesa Civil no domingo (02/01), cerca de 32,5 mil pessoas continuam fora de casa e sem terem um lugar para morar devido às inundações que destruíram cidades inteiras. Já o número de desalojados, que são as pessoas que perderam imóveis, mas conseguiram ser alocadas em casas de familiares ou amigos, chega a mais de 57,4 mil.

Ao todo, 153 cidades do estado nordestino seguem em situação de emergência pelas cheias. A chuva atingiu 661.508 pessoas e deixou pelo menos 25 pessoas mortas. Veja abaixo onde ocorreram as mortes:
Amargosa (2);
Itaberaba (2);
Itamaraju (4);
Jucuruçu (3);
Macarani (1);
Prado (2);
Ruy Barbosa (1);
Itapetinga (1);
Ilhéus (3);
Aurelino Leal (1);
Itabuna (2);
São Félix do Coribe (2);
Ubaitaba (1).

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03 janeiro 2022, 16:11