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Sínodo: “Tem de haver um impulso missionário, não podemos estar em gestão”

O padre Paulo Terroso, membro da Comissão de Comunicação da Secretaria Geral do Sínodo, sublinha que “o Espírito Santo fala na vida das pessoas e é preciso compreender o que está a ser dito”.

Rui Saraiva – Portugal

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O Relatório de Síntese da primeira sessão da XVI Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos bispos “recolhe as convergências, as questões a aprofundar e as propostas que surgiram do diálogo” desenvolvido em Roma em 2023.

A Secretaria Geral do Sínodo publicou recentemente indicações sobre os passos a dar nos meses que nos separam da segunda sessão que decorrerá em Roma no mês de outubro neste novo ano de 2024.

Para o padre Paulo Terroso, membro da Comissão de Comunicação do Sínodo, estes próximos meses são um “tempo de germinação”. Para o sacerdote português, responsável pela comunicação da Arquidiocese de Braga, a síntese sinodal da primeira sessão do Sínodo lança um autêntico caderno de encargos. A entrevista foi conduzida pela jornalista Sónia Neves.

Primeira sessão lança um caderno de encargos

Sónia Neves (SN): O Padre Paulo acompanhou os trabalhos do Sínodo no Vaticano, o que chega a Portugal? Há alguns temas com que podemos ficar apreensivos?

Paulo Terroso (PT): Apreensivos não porque são boas notícias! O Evangelho é todo ele uma boa notícia e ali expressa-se a vida da Igreja e o que foi lá falado discutido. O que é entregue à Igreja, e acho impor nesta fase, neste “tempo de germinação”, usando uma expressão de Timothy Radcliffe, que uma semente lançada à terra é um grande caderno de encargos, grande porque são 80 propostas, 20 delas propostas de comissões teológicas, ou grupos de trabalho e estudo, para envolver toda a Igreja na reflexão dos termos que chegou a uma convergência, onde há questões em aberto e outras necessárias a aprofundar. São 20 temas, não falta matéria, é importante fazer este caminho, responder ao apelo do Papa, porque este caminho para a Igreja é fundamental.

JMJ foi laboratório de sinodalidade

SN: Este é um caminho fundamental, como diz, é também uma oportunidade? A publicação “Não temos medo”, com opiniões de diferentes autores e em que o padre Paulo escreveu o posfácio, gerou encontros e diálogos, lança também um desafio?

PT: Eu não disse aqui uma coisa e não quero me entendem mal, a Jornada Mundial da Juventude (JMJ) foi um sucesso na imagem projetada na forma como foi organizada, nos vários eventos, a Via Sacra agarrou as pessoas e foi absolutamente excecional, as catequeses e todo o processo que ali levou, há ali um laboratório de sinodalidade porém, e eu sublinho no posfácio, não reflete a Igreja em Portugal. Não sei se teria de refletir, mas refere uma possibilidade, é possível exprimir a nossa fé através da dança, das artes, é possível envolver os jovens, os textos como expressão das suas fragilidades dos grandes desafios que se colocam à humanidade, agora o que temo? Nós viemos de um período da Igreja em Portugal muito complexo, bastante duro, o relatório da comissão de investigação dos números, sobretudo das pessoas, o relato de quem sofreu violência, das ocultações, da falta de transparência, e é um período bastante duro. Depois temos dificuldade, e isso é real, é olharmos para as nossas igrejas, não estou numa paróquia, mas estou numa igreja no centro de Braga e as comunidades estão envelhecidas, as que celebram a fé e os sacramentos, estão envelhecidas. A presença dos jovens é pouco efetiva e qual é o meu medo? Que se dê a perceção de uma Igreja, de uma pastoral juvenil que não existe, que isso seja uma espécie de balão de oxigénio, que diz: estamos tranquilos, celebrámos um grande momento. É reconhecido mundialmente e ouvi vários ecos positivos neste tempo em que estive no sínodo, em Roma, mas o que significa para a Igreja em Portugal?

Igreja tem de responder aos desafios

SN: Qual a essência?

PT: Essa é questão… Parece que ganhámos uma espécie de crédito que nos vai deixar viver um ano ou dois de forma tranquila, temos este capital que podemos mobilizar havendo necessidade… Não confundir um evento com a vida da Igreja, com o que é a realidade da Igreja em Portugal, não é ser negativo mas temos problemas sérios de pastoral vocacional, de permanência e de termos cristãos adultos na fé, de assumir as opções fundamentais na vida, como o matrimónio ou a vida consagrada e vida presbiteral e isso tem de ser olhado com realismo, olhando as próprias comunidades… Há um risco associado e tem de haver um impulso missionário, não podemos estar em gestão, o Papa chama a atenção para isso, não se pode estar só a responder aos desafios burocráticos, precisamos de rentabilizar os talentos, o capital que está nas nossas mãos, caso contrário, como diz o Evangelho, “até o pouco que temos nos será tirado”. A Igreja tem de responder aos desafios que a sociedade permanentemente está a colocar e aquilo que Deus fala, o Espírito Santo fala na vida das pessoas e é preciso compreender o que está a ser dito.

Os leigos nos processos de tomada de decisões

SN: É aqui que ganham espaço os leigos?

PT: Sim, tem esse espaço, mas os leigos, e há pouco tempo falava com dois amigos padres, que os leigos têm o seu local, consagrado pelo Concílio Vaticano II mas agora os leigos querem muito mais que isso, querem participar de forma ainda mais ativa, sobretudo nos processos de tomar decisões, de conduzir, há algo para decidir e os leigos têm de ser ouvidos e envolvidos nesse processo. Nem o padre nem o bispo têm de saber tudo, ninguém tem de saber tudo mas, além dos conselhos presbiterais, pastorais, económicos, teriam muito a dar outras pessoas da área da gestão empresarial, desporto, medicina, não podem ter só posição defensiva mas positiva, é importante a questão da afetividade, ou saúde, plano da bioética, não podemos dar respostas mas temos de estar a propor caminhos, a abrir novos horizontes. O Papa com a Laudato Si, que acho que ainda não foi verdadeiramente compreendida e estudada, é uma pedrada no charco, não se está a compreender, ou não está a ser assumida para resolver as nossas questões… A Igreja caminha e quando sai, de forma desassombrada, quando se expõe sem medo, à sociedade e às questões, não podemos viver em situação de desconfiança e confronto, a apologia do valor, aquilo que é a grandiosidade e beleza do cristianismo e sua doutrina passa no exercício direto com as pessoas e a sociedade civil.

Os debates e reflexões nas dioceses neste ano 2024 devem partir do Relatório de Síntese da assembleia sinodal que é fruto do longo processo de escuta iniciado a 9 de outubro de 2021 e que envolveu etapas diocesanas, nacionais e continentais.

“Por uma Igreja sinodal: comunhão participação e missão” é o tema do Sínodo.

Laudetur Iesus Christus

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10 janeiro 2024, 17:32