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A Igreja na Eslováquia

O período sucessivo ao fim do regime comunista e a separação da Eslováquia da República Tcheca caracterizou-se por uma grande vitalidade religiosa no país. Testemunha disso é o boom de ordenações sacerdotais registrado na década de 90, o que permitiu uma mudança geracional no clero, o grande ativismo dos fiéis leigos, o nascimento de novas comunidades cristãs e o florescimento de publicações católicas

Vatican News

De 12 a 15 de setembro o Papa Francisco estará na Eslováquia, onde cumprirá extensa agenda. Vamos saber um pouco sobre a história da Igreja naquele país europeu.

As origens no século IX

 

Evangelizados pelos Santos Cirilo e Metódio no século IX, os territórios da atual Eslováquia permaneceram por séculos sob a jurisdição eclesiástica da Hungria. Assim, os territórios da Eslováquia ocidental e central até Spiš e Gemer fizeram parte por muito tempo da Arquidiocese húngara de Esztergom, enquanto a Eslováquia do leste pertencia à Arquidiocese de Eger.

A primeira e por muito tempo única diocese em território eslovaco foi a de Nitra, erigida em 880 pelo Papa João VIII. Com exceção das cidades da região de Spiš (que em 1412 foram cedidas pelo rei Sigismundo de Luxemburgo à Polônia, e portanto submetidas à jurisdição dos bispos de Cracóvia), esta organização eclesiástica permaneceu substancialmente inalterada até 1776, quando o Papa Pio VI erigiu três novas dioceses em território eslovaco: Banska Bystrica, Spiš e Rožňava, à qual, em 1804 acrescentou-se a Diocese de Košice e em 1818 a Eparquia greco-católica de Prešov, sede dos católicos de rito oriental reunificados com Roma em 1646 com a União de Uzhgorod.

Relações entre Igreja e Estado na ex-Tchecoslováquia, entre as duas grandes guerras

 

Outras mudanças profundas na organização eclesiástica ocorreram após a queda do Império Austro-Húngaro e a constituição da Tchecoslováquia no primeiro pós-guerra. Em 1927 foi estipulado um acordo entre a Santa Sé e o novo Estado que definia os territórios das dioceses e abolia a administração estatal das propriedades da Igreja. As Dioceses de Nitra, Banská Bystrica e Spiš foram removidas da jurisdição das sedes metropolitanas de Esztergom e Eger e submetidas diretamente à Santa Sé.

Começava assim a tomar forma a futura Província Eclesiástica Eslovaca, cujos bispos já começavam a atuar colegialmente e eram representados pelo bispo mais idoso como primus inter pares. Mais um passo em frente foi dado em 1937 com uma Bula do Papa Pio XI que delimitou o território eclesiástico da Eslováquia.

Este processo foi, no entanto, abruptamente interrompido pelos eventos de 1938 e pela Segunda Guerra Mundial. Após a Primeira Arbitragem de Viena (com a qual em 2 de novembro de 1938 a Itália fascista e a Alemanha nazista obrigaram a Tchecoslováquia a ceder grandes porções do sul da Eslováquia e da Rutênia à Hungria), a Santa Sé instituiu uma Administração Apostólica extraordinária com sede em Prešov para as Dioceses de Rožňava, Košice e Szatumar. Tornada independente em 14 de março de 1939, sob o regime pró-nazista pelo sacerdote católico Jozef Tiso, a República Eslovaca estabeleceu relações diplomáticas com a Santa Sé, que enviou o seu encarregado, Mons. Giuseppe Burzio.

A Igreja durante o regime comunista

 

Após o fim da Segunda Guerra Mundial, em 1945 foram restabelecidas as relações diplomáticas entre a Santa Sé e a renascida Tchecoslováquia. A ascensão ao poder dos comunistas em 1948, marcou no entanto o início de um longo período de perseguição. A Tchecoslováquia foi talvez um dos países do bloco soviético onde a política antirreligiosa do regime foi aplicada com maior sistematicidade e dureza. A Igreja eslovaca foi particularmente visada porque foi identificada com a causa autonomista que ameaçava a unidade do Estado. Antes da ascensão ao poder dos comunistas, somente na Eslováquia havia 16 Ordens religiosas masculinas com 96 mosteiros e 1.019 religiosos e 24 Ordens religiosas femininas com 168 mosteiros e 4.253 freiras. Todos foram colocados sob controle e impedidos nas suas atividades.

Muitas dioceses permaneceram vacantes por longos períodos, os padres e bispos permaneceram muitos anos encarcerados e sob estreita vigilância, muitas vezes acusados de atividades contra o Estado (no início da década de 1950 havia na Tchecoslováquia cerca de dois mil sacerdotes em campos de trabalhos forçados ou na prisão.) Alguns deles morreram no cárcere, como o beato Pavel Peter Gojdič, Eparca de Prešov. Muitos fiéis leigos perderam o trabalho, foram processados e condenados por sua fidelidade à Igreja. Os bispos que não foram presos, mas foram impedidos de exercer seu ministério. Entre estes o "bispo operário eslovaco" Ján Chryzostom Korec (22 de janeiro de 1924 - 24 de outubro de 2015), ordenado clandestinamente em 1951 e que João Paulo II nomeou primeiramente bispo de Nitra em 1990 e cardeal em 1991. A Igreja Greco-Católica foi oficialmente proibida e em 1950 foi convocado um sínodo ilegítimo que sancionou sua adesão ao Patriarcado de Moscou. Muitos católicos de rito bizantino passaram neste período ao rito romano, enquanto todas as propriedades da Igreja Greco-Católica foram transferidos para a Igreja Ortodoxa.

Depois de negociações entre a Santa Sé e o governo da Tchecoslováquia, em 30 de dezembro de 1977 o Papa Paulo VI separou com a Constituição “Praescriptionum Sacrosancti” o território da Administração de Trnava da Diocese de Esztergom e estabeleceu os limites diocesanos na Eslováquia e a Arquidiocese checa de Olomouc. Com a Constituição Apostólica "Qui divina” foi portanto, finalmente instituída a Província Eclesiástica Eslovaca. A Administração Apostólica de Trnava foi elevada à Arquidiocese. Ambas as Constituições foram tornadas públicas na Catedral de Trnava pelo arcebispo de Praga cardeal František Tomášek, em 6 de julho de 1978.

A Igreja eslovaca após a queda do muro

 

A "Revolução de Veludo" de 1989 levou ao renascimento da Igreja Católica, maioria na República Eslovaca, e à normalização das suas relações com o Estado. O primeiro efeito da mudança foi a nomeação dos bispos das dioceses eslovacas que ficaram vacantes por muito tempo, a reabertura dos seminários diocesanos e a restituição à Igreja Greco-Católica de bens confiscados pelo regime comunista. Nesse contexto insere-se ainda a decisão de São João Paulo II de instituir com a Bula “Pastorali qiudem permoti "de 1995 uma segunda província eclesiástica da Eslováquia, tornando Košice uma Arquidiocese metropolitana (tendo Spiš e Rožňava como sufragâneas); as suas três Viagens Apostólicas em 1990 (quando ainda fazia parte do Tchecoslováquia), 1995 e 2003; a púrpura cardinalícia para Ján Chryzostom Korec em 1991, mas também a canonização dos Mártires de Košice (1995) e as beatificações de Metod Dominik Trčka e Pavel Peter Gojdič (2001), Vasil 'Hopko e Zdenka Schelingová (2003).

Em 2008, as circunscrições eclesiásticas eslovacas sofreram uma nova reorganização decidida por Bento XVI: em 30 de janeiro a Eparquia Greco-católico de Prešov se tornou uma Arquieparquia metropolitana, o Exarcado apostólico greco-católico de Košice foi elevado à Eparquia e foi  ereta a nova Eparquia de Bratislava. Em 14 de fevereiro, a Arquidiocese latina de Bratislava-Trnava foi dividida nas duas Arquidioceses de Bratislava e Trnava, da qual a primeira é a sede metropolitana. Além disso, foi ereta a Diocese de Žilina e as Dioceses de Nitra e Banská Bystrica foram submetidas a significativas variações territoriais. Este arco de tempo também viu a normalização total das relações entre a Igreja e o Estado, culminando na assinatura em 2000 do Acordo Base com a Santa Sé, que instituiu, entre outras coisas, o Ordinariato Militar, e ao qual, em 2004, também foi seguido um Acordo que regula o ensino da religião católica nas escolas públicas, o status da universidade católica e a pastoral universitária.

Em 2017, a Igreja eslovaca celebrou a beatificação do venerável sacerdote salesiano P. Titus Zeman, mártir do regime comunista, e em 2018 aquela da primeira leiga eslovaca, Anna Kolesarova, de dezesseis anos, que morreu para proteger sua castidade durante a Segunda Guerra Mundial.

Sujeito importante na vida social do país

 

O período sucessivo ao fim do regime comunista e a separação da Eslováquia da República Tcheca caracterizou-se por uma grande vitalidade religiosa no país. Testemunha disso é o boom de ordenações sacerdotais registrado na década de 90, o que permitiu uma mudança geracional no clero, o grande ativismo dos fiéis leigos, o nascimento de novas comunidades cristãs e o florescimento de publicações católicas. 

A Igreja hoje é livre para atuar no setor de educação e da saúde e de fazer com que a sua voz seja ouvida também por meio de seus meios de comunicação (Radio Lumen e Tv Lux, a primeira estação de televisão da Igreja Católica do país a obter, em 2008, licença de radiodifusão). Também é muito atuante no apostolado social, em particular pela Caritas Eslováquia, que com mais de 1.500 funcionários e centenas de voluntários é o maior fornecedor não governamental de serviços assistenciais e sociais no país. A organização de caridade administra quase 300 institutos que oferecem assistência a mais de 20 mil pessoas a cada ano, sobretudo aos idosos, aos doentes incuráveis, pessoas com deficiência ou sem-teto, mães solteiras com crianças. Esta atividade se intensificou com a pandemia Covid-19 que viu muitos sacerdotes e comunidades religiosas comprometidos na linha de frente. A igreja eslovaca também é muito ativa na pastoral cigana, com o apoio da Fundação alemã Renovabis.

Os desafios e as prioridades pastorais da Igreja eslovaca: os jovens e a família

 

Diante desses elementos positivos para a Igreja Eslovaca da era pós-comunista, não faltam sinais preocupantes, como a diminuição dos matrimônios, o aumento dos divórcios e das convivências, o declínio, na última década das vocações sacerdotais e religiosas, como consequência quer do declínio demográfico e da secularização da sociedade eslovaca.

No centro das preocupações pastorais do episcopado eslovaco estão, em particular, os jovens e a família. A pastoral da juventude está focada na formação para ajudar os jovens a encontrar a justa orientação e a permanecer enraizados na fé em uma era de profundas mudanças culturais e sociais. Existem também vários projetos de evangelização voltados aos jovens afastados da Igreja.

No que diz respeito à família, os bispos intervieram repetidamente nos últimos anos em defesa do matrimônio como uma união entre um homem e uma mulher, contra as pressões pela legalização de matrimônios entre pessoas do mesmo sexo, lamentando algumas decisões tomadas a nível de União Europeia neste âmbito. Nesse sentido, também a solicitação endereçada em 2016 ao Parlamento de Bratislava para não ratificar a Convenção de Istambul sobre a violência contra as mulheres, adotada em 2011 pelo Conselho da Europa, por algumas referências à ideologia de gênero. Na mesma direção o reiterado pedido dos bispos para manter o domingo como dia livre e de descanso para dar às famílias a oportunidade de passar algum tempo juntas. Mas não há apenas a preocupação com a pressão para mudar o status da família tradicional: também é forte a consciência da exigência de um acompanhamento pastoral mais orgânico das famílias e de preparar melhor os jovens para o casamento. O ano da Família-Amoris Laetitia convocado pelo Papa Francisco no quinto aniversário da publicação da Exortação Apostólica de mesmo nome sobre a beleza e a alegria do amor familiar ofereceu a oportunidade de relançar este compromisso.

Sempre na perspectiva da defesa dos valores e da identidade cristã da Europa insere-se, por fim, o apoio do episcopado eslovaco às iniciativas de reconciliação promovidas pela Igreja húngara para superar as tensões e incompreensões do passado.

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11 setembro 2021, 07:00