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Dom Luiz Fernando Lisboa, Bispo de Pemba, Moçambique Dom Luiz Fernando Lisboa, Bispo de Pemba, Moçambique 

Moçambique, a fuga de milhares de deslocados em Cabo Delgado

Grupos jihadistas, provavelmente ligados ao Isis, atearam fogo em vilarejos e campos na província de Cabo Delgado no norte do país. Desde o início de outubro, a situação está fora de controle. Entrevista com um missionário italiano: "A ajuda da Igreja não é suficiente para garantir condições de vida aceitáveis".

Antonella Palermo – Vatican News

Mais uma vez o Bispo de Pemba, o brasileiro Dom Luís Fernando Lisboa, denuncia internacionalmente o êxodo de milhares de pessoas que deixam suas casas sob a ameaça e a devastação de grupos extremistas islâmicos armados. O Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados prevê que até dezembro, na província de Nampula, haverá 40 mil pessoas deslocadas. De Maxixe, na província de Inhambane, o Padre Roberto Maver, Superior Regional da Congregação da Sagrada Família de Bérgamo explica o que está por trás dos conflitos, embora a comunicação interna no país seja quase inexistente.

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Os recursos do território

"A província de Cabo Delgado é uma das regiões mais ricas do país: com pedras preciosas, rubis de Montepuez, a presença do gás em Palma, uma das cidades mais ao norte. Porém, os rendimentos das jazidas de minérios estão nas mãos de poderosos locais ou multinacionais que exploram o território", explica o religioso. A economia familiar é baseada no cultivo de hortaliças e na pesca, que é muito frutífera. Nos últimos meses, a situação tornou-se dramática: as populações, especialmente das ilhas Quirimbas, foram obrigadas a deixar suas terras e irem à Pemba, a capital.

Os interesses geopolíticos em jogo

Em Capo Delgado, as razões da tensão são várias: além dos conflitos locais endêmicos, há o aspecto que tem a ver com a extração de rubis e o nascimento do grupo armado islâmico radical. "Com a chegada, em 2017, da empresa contratada e a necessidade de legalizar a atividade de mineração, criou-se um antagonismo com os garimpeiros clandestinos", destaca o Padre Maver. A polícia tentou acabar com este tipo de conflito. "O grupo armado que vem criando problemas desde 2017, e que neste ano destaca-se mais claramente, a princípio só se chocava com as forças armadas moçambicanas, com o tempo a violência foi dirigida contra a população local que é forçada a fugir. As forças de defesa querem garantir a paz para, é claro, garantir a produtividade das economias da região. Infelizmente, nem sempre é fácil e a instabilidade é enorme".

Jovens recrutados à força, sem saber seu destino

"Os interesses do grupo armado são ainda mais difíceis de entender", diz Maver. "Estamos inclinados a pensar que eles querem criar um Estado dentro de um Estado". Eles também são responsáveis pela conquista da cidade portuária de Mocimboa da Praia.

"O fato de terem conseguido tomar posse de um porto que permite a chegada do exterior de pessoas ou outro material é preocupante - lamenta Maver - e o estado moçambicano está tentando enfrentá-los, mas se encontra despreparado. Talvez – supõe – não queira recorrer a uma intervenção internacional para demonstrar a própria força e autonomia”. Os grupos extremistas, bem organizados e com meios e armas muito sofisticadas, contam com as aflições dos jovens moçambicanos para recrutá-los e criar uma rede de informadores nos vilarejos, em troca de dinheiro. Obrigados a partir, muitos deles não voltam mais. Nestes dias em Maxixe foram celebrados três funerais com caixões vazios, porque nem mesmo os corpos são enviados aos familiares.

As ajudas aos deslocados e os temores dos missionários

A Cáritas diocesana de Nacala, é assediada todos os dias por centenas de pessoas de Cabo Delgado. Há cerca de 300 mil pessoas desalojadas em absoluta precariedade", diz-nos novamente o missionário. "Na cidade eles não encontram condições muito melhores e as pessoas oferecem o pouco que têm". A ajuda oferecida por instituições privadas, pela Cáritas e pela Igreja local é insuficiente para garantir uma condição de vida aceitável". A área afetada pelo conflito também é problemática para as missões. Os religiosos não abandonaram a população, ficaram perto dos que sofrem. Mas quando a situação se tornou mais perigosa, prevaleceu a prudência e eles se retiraram para uma comunidade mais tranquila em lugar seguro. "O bispo está acompanhando de perto todos os que são vítimas desta fuga forçada - conclui Maver - e os próprios missionários na esperança de que esta dura prova seja superada".

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04 novembro 2020, 14:49