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Campo de refugiados entre as oliveiras de Idlib na Síria Campo de refugiados entre as oliveiras de Idlib na Síria 

Frei Jallouf: “Da Síria, o Senhor quer que sejamos uma luz de esperança para todos"

“Estamos no ponto mais escuro do mundo, mas o Senhor quer que sejamos uma luz de esperança para todos”. Palavras do franciscano Hanna Jallouf, pároco latino de Knaye, na Síria, onde ainda não tem casos de coronavírus e a igreja está aberta aos fiéis nesta Páscoa

Cidade do Vaticano

Depois de 11 anos de guerra e ao menos 380 mil mortos, assim como mais de 6 milhões de deslocados internos, a Síria não tem condições de enfrentar a emergência Coronavírus. Como medidas de prevenção, as autoridades impuseram confinamento limitado nos arredores de Damasco, declarando também o isolamento da principal localidade santa xiita do país: o santuário de Sayyida Zaynab, na periferia da capital.

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O testemunho

O frei Hanna Jallouf, franciscano da Custódia da Terra Santa e pároco latino de Knayne, no Valle do Oronte, prepara-se para celebrar a Páscoa com 300 famílias cristãs. Na sua região, por enquanto não há nenhum caso de Covid-19, mas conta ao Vatican News, seria um “massacre” se o Coronavírus chegasse aqui. “Não temos hospitais especializados para enfrentar problemas deste tipo” com “o risco de uma epidemia pior do que a que está ocorrendo na Europa e no resto do mundo”.

Seu depoimento:

Frei Jallouf: Estamos em uma região ao norte de Idlib, a 6 quilômetros da fronteira turca. Em três vilarejos cristãos, Knaye, Yakubiyah e Gidaideh, há cerca de 300 famílias, 600 pessoas aproximadamente. A região é controlada por um grupo jihadista rebelde de Al-Qaeda, o Jabhat al-Nusra, aliado com os turcos.

Qual é a situação entre a população?

Frei Jallouf: As pessoas estão desgastadas por tantos anos de guerra. São muito pobres, porque aqui falta tudo. Falta eletricidade, falta água, o custo de vida é alto, um pedaço de pão chega a custar 1 dólar, também precisa comprar gasolina. E sobretudo não há trabalho. Nesta região onde havia 12 milhões de árvores frutíferas e oliveiras, foram cortadas 4 milhões, destinadas à Turquia ou vendidas como lenha.

Neste período, há combates?

Frei Jallouf: Sim, há alguns combates. Mas agora há uma trégua entre a Rússia e a Turquia. Tivemos muitas histórias: por exemplo aqui, ao redor do meu convento, chegaram a cair 47 mísseis! Por enquanto há calma, pelo menos até 14 de abril, quando terminará a trégua. Depois veremos, mesmo se temo que não se chegue à paz, porque cada um fica firme na sua posição, ninguém quer ceder, só vencer. E isso é um problema.

Qual é a situação nos campos de refugiados?

Jallouf: Há muitos campos de refugiados, alguns meses atrás, quando os combates eram intensos muitos deslocados vieram para a fronteira turca. Nos últimos meses chegaram 300 mil pessoas. Mas ninguém pode atravessar a fronteira turca, está fechada. Por isso, com a trégua alguns voltaram para casa.

Como a emergência do Coronavírus pode piorar a situação na sua região?

Frei Jallouf: Considerando que o grupo jihadista que controla esta zona fechou as fronteiras e estradas, estamos quase em uma ilha. Por enquanto não temos nenhum contaminado. Por isso as igrejas da nossa região ainda estão abertas. Mas tomamos precauções, por exemplo tiramos a água santa e a saudação da paz. Seguimos pela televisão a oração do Santo Padre e rezamos com ele para que realmente este mal passe o mais cedo possível.

Como vocês poderiam enfrentar uma eventual emergência coronavírus?

Frei Jallouf: Não temos nenhuma condição de enfrentar casos se alguém ficasse contagiado. Seria um verdadeiro massacre se o Covid-19 chegasse aqui. Não temos hospitais especializados e a epidemia poderia ser maior do que a da Europa e do resto do mundo.

O Papa associou-se ao apelo da ONU para cessar as hostilidades bélicas. Os apelos tiveram repercussão?

Frei Jallouf: O Santo Padre não esquece da Síria e de outros países. O problema é que os outros não pensam. Mas temos confiança no Senhor para que ilumine os corações para a paz.

O senhor disse que as igrejas ainda estão abertas, que não estão sob controle governamental. Como será a Páscoa?

Frei Jallouf: No resto da Síria tudo está fechado, até as igrejas. Na minha região ficamos apenas em dois franciscanos. Para as igrejas latinas de Knaye e Yakubiyah seguimos o que foi determinado pela Santa Sé para os ritos pascais: sem lava-pés, beijo da Cruz, mas as outras orações serão feitas. Pedimos aos fiéis com sintomas de gripe para ficarem em casa. No Domingo de Ramos disse aos fiéis: “É verdade que estamos no ponto mais escuro do mundo com a nossa situação, mas o Senhor quer que sejamos uma luz de esperança para todos”.

Qual é o sentido de celebrar a Páscoa na Síria depois de nove anos de guerra e com a emergência Coronavírus que ameaça o país?

Frei Jallouf: Esperamos no ressurgimento do nosso país à vida, como o Senhor ressurgiu da Morte. Esperamos que esta Páscoa seja a última que se viva em guerra. Por isso rezamos ao Senhor pela paz. Depois da morte há sempre a vida. E desejamos também que todo o mundo vença o Coronavírus, para que realmente do mal chegue o bem universal, com as pessoas que voltam à sua fé, à sua esperança, à sua caridade.  

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07 abril 2020, 11:59