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Dom Arellano: o Nobel da Paz para o objetivo Fome Zero

“Para acabar com a fome precisamos conjugar o verbo ‘fazer’ e esquecer toda essa grande retórica que, no final, não leva a nada”. Palavras de Dom Fernando Chica Arellano, Observador Permanente da Santa Sé junto à FAO, Ifad e Pam (WFP) ao comentar o Prêmio Nobel da Paz ao Programa Alimentar Mundial

Alessandro Di Bussolo – Vatican News

Com o Prêmio Nobel da Paz ao Programa Alimentar Mundial (PAM/WFP), o Comitê de Estocolmo destaca "que fome e paz são elementos muito conectados" e que "o comércio de armas não deve ser aumentado, mas sim as ajudas", como disse o Papa Francisco ao visitar a sede do PAM em 2016. São palavras do arcebispo Fernando Chica Arellano, Observador Permanente da Santa Sé junto à FAO, Ifad e o PAM (WFP), ao Vatican News. O arcebispo recorda que o segundo objetivo da Agenda 2030 das Nações Unidas, o Fome Zero, está a apenas 10 anos de distância, "e ainda estamos muito longe".

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Entrevista com Dom Fernando Arellano

Dom Arellano: Este prêmio destaca, acima de tudo, a importância de continuar a luta contra a fome, sem esquecer que a fome e a paz estão muito ligadas. O Santo Padre já havia dito isto quando visitou o Programa Alimentar Mundial, em 13 de junho de 2016. Na ocasião disse palavras de clarividência quando falou sobre a instabilidade mundial em que vivemos e como os conflitos existentes, as armas, adquiriram uma preponderância incomum, e que se multiplicavam. O Papa fez um vigoroso apelo pela paz, sobretudo para não multiplicar o comércio de armas, mas para aumentar as ajudas humanitárias. Porque muitas vezes, disse Francisco na ocasião, a própria fome é usada como arma de guerra, e as vítimas estão se multiplicando. Em vez de investir em armas, invista-se na paz. É urgente desburocratizar qualquer coisa que impeça a implementação de planos de ajudas humanitárias. E nisto o Programa Alimentar Mundial tem um papel fundamental, porque o mundo precisa de verdadeiros heróis, ou seja, de pessoas e instituições que se comprometam a abrir estradas, a construir pontes, para diminuir o número de pessoas que sofrem, para aumentar a paz e para que a fome seja totalmente erradicada.

Podemos dizer que uma fundação leiga como a do Prêmio Nobel coloca-se na linha do Papa Francisco, primeiro com a encíclica 'Laudato si’' e depois com 'Fratelli tutti', para pedir um novo modelo econômico mundial que coloque precisamente os mais vulneráveis em primeiro lugar?

Dom Arellano: Claro. Penso que o mundo deve esquecer tudo que possa ser uma ferida para a dignidade humana e colocar os mais vulneráveis, os pobres, os descartados, os famintos, os doentes e todos os que sofrem com a pandemia, no centro dos interesses e, especialmente, do trabalho da humanidade. Que esta humanidade esqueça o egoísmo, o pensar em si mesma e que brilhe o amor pelas pessoas mais pobres em todos os lugares para ajudá-las a viver com dignidade. A última encíclica do Papa Francisco é realmente uma lição maravilhosa para continuar a lutar contra todos esses vírus que estão fazendo a humanidade sofrer.

Na encíclica 'Fratelli tutti' o Papa propõe a construção de um Fundo Mundial para eliminar definitivamente a fome e para o desenvolvimento dos países mais pobres com o dinheiro que está sendo usado com armas. Mas precisamos de uma forte vontade política por parte dos Governos, dos que produzem e dos que usam armas...

Dom Arellano: O Papa recuperou o pensamento de Paulo VI que quando foi à Índia, a Bombaim, viu todas aquelas pobres pessoas, e teve esta brilhante ideia do Fundo e depois a repetiu na Populorum progressio. Agora Francisco retoma esta maravilhosa ideia e a lança novamente a um mundo sedento de paz, sedento de dignidade e me parece que seria uma coisa maravilhosa, se houvesse a vontade de agir. Contra a fome há muitas palavras, há uma grande retórica. Mas agora deve começar o tempo de agir: precisamos de fundos, precisamos de gestos, precisamos de programas concretos para que a fome seja como uma peça de museu, algo do passado, e não um flagelo que atormenta o presente e, sobretudo, que, se não fizermos algo, atormentará também o futuro. Em 2030, a comunidade internacional havia estabelecido uma data para a eliminação da fome, mas me parece que ainda estamos muito longe do sucesso se algo não for feito. A agenda de 2030 para o desenvolvimento sustentável não deve permanecer apenas uma boa ideia, pois o mundo está cansado de palavras. Precisamos realmente de gestos, e de gestos reais e concretos. Precisamos conjugar o verbo "fazer" e esquecer toda essa grande retórica que, no final, não leva a nada.

 

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12 outubro 2020, 09:19