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Card. Amato sobre o "Maiorem hac dilectionem" e a Instrução sobre as relíquias

Dois documentos de 2017 incidem diretamente nas atividades desenvolvidas pela Congregação para as Causas dos Santos: o 'Motu Proprio' que reconhece a "oferta da vida" como novo caminho para a beatificação e canonização e a Instrução "As relíquias na Igreja: autenticidade e conservação"

Cidade do Vaticano

Existem fiéis que viveram e testemunharam a caridade até o último momento de sua existência, mesmo conscientes dos riscos que corriam ao dedicarem-se aos cuidados de enfermos com doenças infeciosas ou no campo de batalha para prestar socorro aos feridos.

Quando reconhecida pela Igreja, esta oferta da vida representa um ulterior caminho de beatificação e canonização, depois do martírio e da heroicidade das virtudes.

O Papa Francisco traçou as característica deste caminho no Motu proprio “Maiorem hac dilectionem” de 11 de julho de 1017, um documento que marcou de sobremaneira as atividades desenvolvidas pela Congregação das Causas dos Santos no ano que recém findou.

Ano que também se concluiu no signo de outro importante documento, a instrução “As relíquias na Igreja: autenticidade e conservação” – publicada há pouco mais de duas semanas – que disciplina a custódia, o cuidado, o transporte e a autenticação das relíquias de Servos de Deus, Beatos e Santos.

O Cardeal Angelo Amato falou sobre estes temas em entrevista concedida ao L’Osservatore Romano.

O Motu Proprio  «Maiorem hac dilectionem» sobre a oferta da vida introduziu uma importante novidade no procedimento tradicional da Congregação. Já existem frutos destas mudanças no processo das causas de canonização?

“Talvez fosse conveniente precisar o conteúdo da oferta da vida, de que fala o documento. Para a atual legislação, antes do ‘Motu Proprio’, os caminhos para a beatificação de um servo de Deus eram, salvo raras exceções, substancialmente dois: aquele fundado na heroicidade das virtudes e aquele fundado no martírio. Agora se soma um terceiro caso, que diz respeito aos cristãos que, seguindo mais de perto as pegadas e os ensinamentos do Senhor Jesus, oferecem voluntariamente e livremente a vida pelos outros, perseverando até a morte neste propósito. Até agora não existem causas de beatificação pautadas nesta modalidade”.

A que se deve isto?

Penso que ainda se deva assimilar bem este terceiro caminho que, mesmo claramente distinto daquele da heroicidade das virtudes e do martírio, contempla precisas modalidades de atuação. O ‘Motu Proprio’, de fato, elenca cinco critérios que qualificam a oferta da vida. O primeiro e o mais importante requer a heroica aceitação ‘propter caritatem’ de uma morte certa e em breve espaço de tempo. Não se trata, porém, de martírio, porque o martírio contempla o ‘odium fidei’ por parte dos perseguidores. Obviamente, o servo de Deus, deve ter vivido em modo extraordinário as virtudes cristãs”.

O senhor poderia citar algum exemplo?

“Poderiam entrar nesta modalidade – depois de um exame cuidadoso de cada caso – aqueles, por exemplo, que durante uma peste, contraem a doença assistindo por caridade os doentes e sucumbem contagiados pelo mesmo mal. Mesmo não sendo martírio, porque não existe um perseguidor que odeia a fé cristã, aqui estamos diante da oferta da própria vida ‘usque ad mortem’. Entrariam neste caso também aqueles cristãos – como bispos, párocos, missionários, médicos, educadores, militares, pais e mães de família – que se oferecem espontaneamente por um ato de caridade pessoal ou social de tal forma arriscado, que permite prever o sacrifício da vida como certo. Um exemplo poderia ser representado por aquelas gestantes cristãs que, para não prejudicar a criança que trazem no ventre, refutam os cuidados necessários para a saúdes delas, iniciando assim uma morte prematura e certa. Heroico é também aquele gesto de um jovem, que assume livremente e por caridade cristã o lugar de um condenado à morte, pai de família com filhos pequenos. Entraria nesta modalidade também o caso de um capelão militar que, ao invés de buscar salvar-se, continua a assistir o moribundo sob o fogo inimigo, até ser morto. Como se vê, os exemplos podem ser muitos e são analisados e documentados com extrema atenção”.

No passado houve casos deste tipo?

“Certamente, mas foram tratados no âmbito das duas vias tradicionais. Por exemplo, Luiz Gonzaga (1568-1591) obteve de seus superiores religiosos a permissão para dedicar-se à assistência dos doentes em Roma, sendo contagiado até morrer. Damião de Veuster (1840-1889), missionário nas Ilhas Hawaii, ofereceu-se como voluntário para assistir os leprosos na Ilha de Molokai, onde contraiu o mal. Também a sua causa seguiu o caminho das virtudes. O mesmo se pode dizer de Gianna Beretta Molla (1922-1062), mãe de família e médica. Na terceira gravidez se submete a uma difícil operação. O único pedido aos médicos foi: ”Salva a minha criatura”.  Uma semana após o parto morreu vítima de seu sacrifício para salvar a filha. Concluindo, o ‘Motu Proprio’ de julho passado introduz oficialmente nos procedimentos das causas de beatificação um novo modelo de santidade canonizável, o do seguimento de Cristo na imitação de seu supremo ato de amor, como recita o Evangelho de João: “Ninguém tem maior amor do que quem dá a vida pelos próprios amigos”.

Sabemos que a instrução sobre as relíquias de 17 de dezembro foi elaborada por um longo período. A partir de que exigências ela nasceu?

Da urgência de clareza sobre o significado, o valor, a autenticidade e a conservação das relíquias”.

O que são as relíquias e porque são veneradas na Igreja?

Segundo a bilenar tradição cristã, as imagens e as relíquias dos Santos são levadas em grande consideração na Igreja. O motivo da sua veneração reside no fato de que o corpo dos Beatos e dos Santos foi na terra o templo vivo do Espírito Santo e o instrumento de sua santidade”.

Existem diferentes espécies de relíquias?

“As relíquias se subdividem em relíquias insignes e em relíquias não insignes. São consideradas relíquias insignes o corpo inteiro dos Beatos e dos Santos ou parte notável de seu corpo ou todo o volume das cinzas derivado de sua cremação. Para assegurar a sua veneração e evitar eventuais abusos, elas devem ser  preservadas em urnas apropriadas, sigiladas e colocadas em locais que garantam a sua segurança e favoreçam o seu culto”.

O que se entende por relíquias não insignes?

“Trata-se de pequenos fragmentos dos corpos dos Beatos e dos Santos ou também de objetos que estiveram em contato direto com eles. Também as relíquias não insignes, custodiadas em tecas sigiladas, são objeto de honra e veneração”.

Quais são os aspectos particulares do documento?

“A instrução é de grande utilidade para os bispos e os eparcas porque oferece normas precisas relativas ao reconhecimento dos restos mortais dos Beatos e dos Santos, o traslado deles de um local a outro ou a uma eventual peregrinação de uma cidade ou nação para outra. Para todas estas operações, além da permissão das autoridades eclesiásticas e civis implicadas, é indispensável o consenso da Congregação das Causas dos Santos”.

(L'Osservatore Romano)

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05 janeiro 2018, 11:26