Uma mulher pede esmola Uma mulher pede esmola 

O Magistério dos Papas sobre a esmola

Dividir os próprios bens com os mais necessitados sempre esteve presente no Magistério da Igreja em todos os séculos. Um preceito sempre atual em tempos de grandes disparidades econômicas. Junto com a oração e o jejum, a esmola é uma das três “armas” dos cristãos no combate espiritual do tempo da Quaresma

Cidade do Vaticano

Dar esmola, para sair da insensatez de viver e acumular tudo para nós mesmos, com a ilusão de assegurarmos um futuro que não nos pertence. E, assim, reencontrar a alegria do projeto que Deus colocou na criação e no nosso coração: o projeto de amar a Ele, aos nossos irmãos e ao mundo inteiro, encontrando neste amor a verdadeira felicidade”. São palavras do Papa Francisco na sua Mensagem para a Quaresma de 2019.

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Esmola, um dos preceitos fundamentais da Quaresma

Coloquemo-nos, portanto, todos a caminho. Busquemos a força para os bons propósitos na oração, em uma oração convalidada pela plena disponibilidade ao sacrifício e também à renúncia generosa de algo que nos pertence, a fim de ter com que ajudar os pobres. É um antigo conselho de quem foi um mestre de vida espiritual, Santo Agostinho:

“Queres que a tua oração voe até Deus?” Ele pergunta, “Coloque nela as asas do jejum e da esmola” (S. Augustini Enarr. in Ps. 42, 8). O programa é claro. Que o Senhor nos conceda a generosidade necessária, para que esta penetre na vida concreta de cada dia”

Assim falou o Papa Paulo VI na Quarta-feira de Cinzas de 1978, era o dia 8 de fevereiro.

João Paulo II e a esmola

Mas quem são realmente “os pobres”? Somete os mendigos que vemos pelas ruas? E o que significa realmente “esmola”? Temos certeza que para praticá-la basta colocar algumas moedinhas dentro de uma mão estendida e escapar o mais rápido possível, com a consciência tranquila?

Hoje não ouvimos de boa vontade a palavra ‘esmola’. Encontramos nela alguma coisa de humilhante. Esta palavra parece supor um sistema social em que reina a injustiça, a desigual distribuição dos bens, um sistema que deveria ser mudado com reformas adequadas. E se tais reformas não fossem realizadas, delinear-se-ia no horizonte da vida social a necessidade de mudanças radicais, sobretudo no campo das relações entre os homens. (…)

“Podemos não estar de acordo com quem dá a esmola, pelo modo como a dá. Podemos também não concordar com quem estende a mão pedindo esmola, se não se esforça por ganhar a vida por si mesmo. Podemos não aprovar a sociedade, o sistema social, em que haja necessidade de esmola. Todavia, o fato mesmo de prestar auxílio a quem precisa, o fato de repartir com os outros os próprios bens deve merecer respeito”

Era o dia 28 de março de 1979 quando João Paulo II pronunciou estas palavras, na Audiência Geral. A Itália passa por um período muito difícil com sequestros, escândalos e assassinatos de jornalistas. No Irã tem a volta do aiatola Komeini depois de 15 anos de exílio… e nos Estados Unidos verifica-se uma dos mais graves acidentes da história da energia nuclear com a explosão em Three Mile Island. Ninguém parece pensar nos pobres…

Não será repartir tua comida com quem tem fome? Hospedar na tua casa os pobres sem destino? Vestir uma roupa naquele que encontras nu e jamais tentar te esconder do pobre teu irmão? Aí, então, qual novo amanhecer, vai brilhar a tua luz, e tuas feridas hão de sarar rapidamente. Teus atos de justiça irão à tua frente e a glória do Senhor te seguirá (Is. 58, 6-8)”.

A última Quarta-feira de Cinzas de João XXIII

João XXIII, na sua última Quarta-feira de Cinzas era o dia 27 de fevereiro de 1963, tinha insistido sobre o preceito da caridade como perfeita expressão do espírito conciliar…

Portanto é o Concílio que dá o tom à Quaresma deste ano, insistindo especialmente no compromisso de todo o bom cristão a viver o preceito da caridade, mais do que a deter-se em contemplar a nova floração da qual todos irão se alegrar. É tarefa de artífices, e não de espectadores”.

Bento XVI e São Leão Magno

Artífices da caridade em um mundo cada vez mais dilacerado pela tensão e ferocidade. Um desafio muito difícil. Ano de 2011. O novo milênio recém iniciou e há quem fala de nova Idade Média, de choque de civilizações, de invasões bárbaras… Talvez por isso Bento XVI evoca um seu longínquo predecessor. Era a audiência geral de 9 de março:

São Leão Magno ensinava num dos seus discursos sobre a Quaresma: (…) a estes jejuns obrigatórios e santos, nenhuma obra pode ser associada mais utilmente que a esmola que, sob o único nome de ‘misericórdia’, inclui muitas obras boas. Imenso é o campo das obras de misericórdia. Não só os ricos e abastados podem beneficiar os outros com a esmola, mas também quantos vivem em condições modestas e pobres. Assim, desiguais nos bens de fortuna, todos podem ser iguais nos sentimentos de piedade da alma’ (Discurso sobre a Quaresma, 2: PL 54, 286)".

“Na sua Regra pastoral, são Gregório Magno recordava que o jejum torna-se santo através das virtudes que o acompanham, sobretudo da caridade e de cada gesto de generosidade, que confere aos pobres e aos necessitados o fruto de uma nossa privação (cf. 19, 10-11)”

Só a esmola não basta

Nada deve ser finalizado a si mesmo. Nem o jejum que deve ser obrigatoriamente ser  finalizado ao compartilhamento, à esmola, portanto, e não só à esmola que não pode se limitar a um fato material, às moedinhas dadas rapidamente, à asséptica doação em favor de um centro de acolhimento de refugiados ou de uma ONG, por mais que sejam apreciados os gestos…

Eis como, com a instituição da Quaresma, a Igreja não conduz seus filhos a simples exercícios de práticas exteriores, ma a sérios compromissos de amor e de generosidade pelo bem dos irmãos, à luz do antigo ensinamento dos profetas”.

Esmola é um dom interior

São palavras reafirmadas por João XXIII na já citada Radiomensagem para a Quaresma de 1963. E João Paulo II na audiência de 28 de março de 1979, sublinha a carga espiritual da oferta aos pobres…

“Na Sagrada Escritura e segundo as categorias evangélicas, ‘esmola’ significa, primeiro que tudo, dom interior. Significa a atitude de abertura ‘para o outro’. Precisamente esta atitude é fator indispensável da 'metánoia', isto é, da conversão, do mesmo modo que são também indispensáveis a oração e o jejum (…).”

Pois eu estava com fome, e me destes de comer; estava com sede, e me destes de beber; eu era forasteiro, e me recebestes em casa; estava nu e me vestistes; doente, e cuidastes de mim; na prisão, e fostes visitar-me’. Então os justos lhe perguntarão: ‘Senhor, quando foi que te vimos com fome e te demos de comer? Com sede, e te demos de beber? Quando foi que te vimos como forasteiro, e te recebemos em casa, sem roupa, e te ves­timos? Quando foi que te vimos doente ou preso, e fomos te visitar?’ Então o Rei lhes responderá: ‘Em verdade, vos digo: todas as vezes que fizestes isso a um destes mais pe­quenos, que são meus irmãos, foi a mim que o fizestes!’” (Mt 25,35-40).

 

  

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09 abril 2019, 11:44