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Hebe Bonafini, Fundadora das Madres de Palaz de Mayo Hebe Bonafini, Fundadora das Madres de Palaz de Mayo 

A fundadora das Madres de Plaza de Mayo encontrou sua fé com Francisco

Hebe de Bonafini , fundadora e presidente das Madres de Plaza de Mayo, a associação de mulheres que há quase 50 anos vem exigindo verdade e justiça na Argentina para os desaparecidos durante a ditadura militar, faleceu aos 93 anos de idade. Durante anos ela criticou Jorge Mario Bergoglio, depois, em 2016 encontraram-se na Santa Marta e ela pediu o seu perdão

Salvatore Cernuzio – Vatican News

Na próxima quinta-feira, pela primeira vez em quase 50 anos, Hebe de Bonafini não estará presente em uma das "rondas" da Plaza de Mayo, com o simbólico lenço branco atado na cabeça, para exigir verdade e justiça para os maridos, filhos e outros membros da família que desapareceram durante a guerra suja na Argentina (1976-1983). A senhora líder das Mães da Praça de Maio perdeu dois filhos, Jorge Omar e Raúl Alfredo, e sua nora, completamente desaparecidos como tantos outros opositores do regime.

Luto nacional na Argentina

Hebe de Bonafini, fundadora e presidente das Madres de Plaza de Mayo, a associação formada por mulheres e mães de todos os desaparecidos durante a ditadura militar, faleceu no domingo (20) aos 93 anos. Na primeira quinzena de outubro, ela havia sido hospitalizada por três dias no Hospital de La Plata para controles que não revelavam nenhuma patologia em particular. Promotora de numerosas iniciativas, entre as quais uma Universidade de Direitos Humanos, na Argentina ela era considerada uma instituição tanto que o governo do Presidente Alberto Fernandez, ao saber da notícia de sua morte, decretou três dias de luto em todo o país.

A relação com o Papa

A relação com Jorge Mario Bergoglio, o atual Papa Francisco, foi um ponto-chave na sua história pessoal. No passado, ela havia criticado dura e continuamente o então Arcebispo de Buenos Aires, depois os dois se encontraram novamente, antes através de cartas e mensagens, enfim pessoalmente na Casa Santa Marta em 2016. Foi por causa desta relação que Hebe Bonafini disse ter reencontrado sua fé. "Eu tinha perdido completamente a minha fé e quando a relação começou, ele me restituiu a fé, que é tão necessária.... Sem fé não se pode viver, e graças a esta fé falo com meus filhos todas as noites", disse a senhora Hebe à rádio AM-530 em uma entrevista. O Papa Francisco "tinha me convidado muitas vezes para ir ao Vaticano". Sentia que não deveria ir porque já havia discutido com ele muitas vezes. Até que um dia ele enviou um bispo à minha casa, com quem falei e aceitei o convite para visitá-lo".

O encontro de 2016 na Casa Santa Marta

A senhora Bonafini foi à Casa Santa Marta no Vaticano, onde reside o Papa, na manhã de 28 de maio de 2016. O encontro foi longo, mais de duas horas e afetuoso, de acordo com as palavras da senhora a um grupo de jornalistas: "Ficamos emocionados e nos abraçamos". No encontro falaram sobre a dramática situação na Argentina, com pessoas desempregadas e lutando para sobreviver. O Papa tinha acima de tudo "escutado" com grande atenção, disse a ativista, admitindo publicamente que tinha se enganado sobre o Papa Bergoglio, que ela não conhecia seu compromisso pelos pobres, e que tinha pedido desculpas a ele. 

Em uma entrevista ao jornal La Nacion em julho de 2016, o Papa falou sobre o encontro de maio, comentando sobre este pedido de desculpas: "Foi um gesto de perdão. Ela me pediu perdão e eu não lhe neguei. Não nego isso a ninguém. Ela é uma mulher que teve dois filhos assassinados. Eu me curvo, ajoelho-me diante de tanto sofrimento. Não importa o que ela disse de mim. E eu sei que ela disse coisas horríveis no passado".

Cartas e mensagens

A relação entre o Pontífice e o presidente da Madres de Plaza de Mayo continuou nos anos seguintes através de cartas. Em 2017, a senhora Hebe enviou uma carta ao Papa dizendo-lhe que a Argentina precisava dele: "Estamos passando por um período muito ruim, o país parece uma montanha que desaba como quando há um terremoto". Também recordou os 40 anos “da luta” das Madres, “sem deixar de ir uma única quinta-feira na praça”: '2036 marchas, restam apenas algumas de nós, mas construímos uma ponte indestrutível entre os nossos filhos e as novas gerações que levaram a Pátria a sério, então nós Madres morreremos serenas porque a luta e a defesa da vida estão nas melhores mãos, as dos jovens que estão empenhados em lutar pelos outros e pelas outras". Francisco respondera enviando um livro e uma carta na qual repetia "o que disse muitas vezes e lhe expressei quando estava no Vaticano: diante da dor de uma mãe que perde seus filhos de maneira tão cruel e violenta, sinto um profundo respeito e a necessidade de acompanhá-la com minha proximidade e minha oração. Só ela sabe o que significa sofrer".

Encorajamento

Ainda em fevereiro de 2018, a senhora Hebe tinha compartilhado durante um encontro das Madres da Praça de Maio uma nova mensagem que o Papa tinha enviado a ela, na qual escreveu: "Rezo por vocês e pelas Madres e peço ao Senhor que as mantenha em boa saúde para que possam continuar a ajudar tantas pessoas". Na ocasião, Francisco encorajou a senhora a ir em frente sem se preocupar com as calúnias que circularamm sobre ela: aquelas, escreveu ele, "só sujam a consciência e a mão daqueles que as lançam. Não se esqueça de rezar por mim. Saudações para as mães".

A mesma saudação e bênção foi renovada pelo Papa há alguns meses, em carta datada de 1º de maio de 2022, no dia seguinte ao 45º aniversário da primeira "ronda" em 30 de abril de 1977, quando o grupo de mulheres tinha marchado em torno da Píramide de Mayo para pedir a reaparição "em vida" de seus filhos presos ou desaparecidos. O Papa agradecia-lhe por um livro que tinha recebido de presente: “Li com atenção e é admirável a trajetória que as madres da Praça de Maio, com perseverança, seguiram ao longo destes 45 anos”. Um caminho que agora perde sua guia, mas que vai continuar.

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21 novembro 2022, 14:52