Padre. Adelson Araujo dos Santos Padre. Adelson Araujo dos Santos 

Pandemia: momento de refletir o profetismo do Papa Francisco

Um momento que a humanidade vive no medo e incertezas diante de um vírus que ameaça a vida. O Papa Francisco na Exortação Apostólica Querida Amazônia coloca diante da humanidade um pedido e uma súplica de defesa da Casa Comum ameaçada com o avanço de atitudes que destroem o ecossistema e a hora de refazer conceitos e atitudes. Nesta entrevista padre Adelson Araujo dos Santos reflete sobre o profetismo do Papa Francisco.

Ricardo Gomes – Diocese de Campos

A reflexão sobre o Sínodo da Amazônia deve inspirar reflexões e propostas oriundas do Sínodo para inspirar a viver em harmonia com a Criação, defendendo a vida e o cuidado da nossa "Casa Comum", por meio de uma verdadeira ecologia integral. O sacerdote jesuíta Pe. Adelson Araujo dos Santos, autor do livro Amazônia, um lugar teológico, lançamento de Edições Loyola e  um dos participantes do Sínodo sobre a Amazônia, na qualidade de perito, nomeado pelo Papa Francisco traça um caminho iniciado pelo Papa Francisco na Carta Encíclica Laudato Si e na Exortação Apostólica Querida Amazônia.

Neste momento o cuidado com a Região Amazônica não significa colonizá-la e depredá-la com políticas extrativistas em grande escala, as quais destroem o meio ambiente e ameaçam as populações indígenas. Não se trata de mitificar as culturas autóctones ou de excluir a priori a miscigenação, nem de cair no discurso que ‘se preocupa com o bioma, mas ignora os povos amazônicos. 

“Identidade e diálogo são duas palavras-chave para Francisco, não sendo de modo algum contrapostas. A proteção aos valores culturais das populações indígenas diz respeito a todos nós: devemos sentir-nos corresponsáveis para com a diversidade de suas culturas. Papa Francisco na Exortação Apostólica Querida Amazônia emerge com grande clareza a perspectiva cristã, que se distancia tanto de um indigenismo fechado quanto de um ambientalismo que considera os seres humanos a ruína do planeta”, destaca.

Padre Adelson destaca que a encíclica “Laudato Sì” é não só o primeiro documento escrito por um Papa sobre a ecologia, mas dá a este tema uma nova e mais completa abordagem, quando o chama de Ecologia integral,  ajudando a perceber que defender a natureza e a  “Casa Comum” (o planeta) vai muito além de uma simples bandeira ambientalista, pois tem a ver com todas as formas de agressão e destruição do próprio ser humano, a começar pelos mais frágeis e vulneráveis, como são as crianças, os idosos, as populações indígenas, os excluídos em geral.

“Por sua vez, a exortação apostólica pós-sinodal “Querida Amazônia” coloca esta região vital para a sobrevivência humana no centro das atenções mundiais, dentro e fora da Igreja, nos alertando para o drama vivido hoje pelos seus povos tradicionais, ameaçados de extinção, e o completo desrespeito pela maior reserva de água doce e de biodiversidade do planeta, da parte de governantes e do sistema econômico vigente. Além disso, o sínodo traz para as igrejas amazônicas e para os cristãos, em geral, novos sopros do Espírito do Deus Criador e Redentor, com propostas concretas de renovação cultural, pastoral e sinodal para as nossas comunidades”, relata.

O Papa Francisco é bem direto e incisivo quando afirma que “a trágica pandemia do coronavírus demonstra, que só unidos cuidando dos mais frágeis se poderá vencer os desafios globais” . Ou seja, não há mais espaço para pensamentos e atitudes mesquinhas, seja individualmente, seja como políticas de governo, onde cada um só pensa em si ou no seu grupo (familiar, social, partidário, regional, etc.). Por meio da dor de milhares de pessoas que perderam seus entes queridos pelo coronavírus, se percebe que para o vírus não há primeiro ou terceiro mundo, ricos ou pobres, brancos ou negros, todos ficaram expostos a uma situação de total vulnerabilidade.

“Pelo menos por sensatez deveríamos aprender a sermos mais solidários e unidos, diante de um inimigo tão mortal e perigoso como é a Covid-19. Mas, além disso, deveríamos reconhecer a nossa responsabilidade em tudo isso, na medida em que a ciência tem a cada dia confirmado que, quanto mais o ser humano agride a natureza, mais catástofres climáticas e doenças pandêmicas virão. Também quanto a isso o Papa é muito claro, quando diz: “Devido ao egoísmo, falhamos na nossa responsabilidade de guardiães e administradores da Terra. Basta olhar a realidade com sinceridade para ver que há uma grande deterioração da nossa casa comum. Poluímo-la, saqueamo-la, colocando em perigo a nossa própria vida”, disse.

Rever atitudes e comportamentos

Como cristãos que defendem a vida, não só dentro, mas também fora do útero materno, e como cidadãos cumpridores da lei, a começar pela Constituição Federal, cremos que uma ação que se faz cada vez mais urgente é a defesa da conservação das condições de vida do planeta, como uma questão ética e espiritual.

“Estaríamos incorrendo em grave pecado de omissão se, diante das políticas atuais de descaso com a destruição das florestas, as invasões das terras indígenas, a poluição dos rios e lagos, etc. nos calarmos e não reagirmos. Sabemos que mesmo dentro da Igreja há muitos interesses que se opõe ao pensamento do Papa Francisco, mas não tenho dúvidas de que, falando da Cátedra de Pedro, ele está sendo a voz de Deus quando diz: “não é salutar habituarmo-nos ao mal; faz-nos mal permitir que nos anestesiem a consciência social, enquanto um rasto de delapidação, inclusive de morte, por toda a nossa região, coloca em perigo a vida de milhões de pessoas”. E se o Mestre Jesus foi perseguido e atacado por seus posicionamentos em favor do Reino de Deus, por que o Papa, eu, você, não seríamos também?”, conclui padre Adelson.

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06 setembro 2020, 10:07