2020.07.03 Alleluja Care Center, Malauí 2020.07.03 Alleluja Care Center, Malauí  A história

De Bérgamo a Malauí: uma vida dedicada aos órfãos

Rita Milesi, 77 anos, mora há 46 anos em um dos países mais pobres e esquecidos do mundo, o Malauí. Fundou um Centro para cuidar das crianças abandonadas e desnutridas e dar-lhes um futuro. Já salvou 2.500 crianças. Rita chora pela perda de muitos amigos na sua terra natal Bérgamo por causa do coronavírus, e espera uma renovação sócio-política e econômica do país com seu novo presidente

Antonella Palermo – Vatican News

No Malauí, um dos países africanos mais pobres e esquecidos do mundo, há uma pequena Bérgamo. Uma das cidades italianas mais atingida pelo coronavírus. Rita Milesi, nasceu em Bérgamo, há 77 anos e está no Malauí desde 1974. Ela conta que perdeu três amigos de Bérgamo que lhe enviavam apoio através das adoções a distância das suas crianças. Explica que "em alguns vilarejos há alguns focos da doença, mas estão bastante isolados. A impressão é que as pessoas ainda não entenderam realmente a seriedade disso. "Enquanto isso, fizemos 5000 máscaras e aqui todos os funcionários do Centro sãos obrigados a usá-las". Rita fundou no país o Alleluya Care Center, onde são assistidas crianças órfãs e desnutridas. É uma leiga voluntária, mora sozinha, uma mulher com grande tenacidade e alegria interior e muito amável e simpática que mesmo por telefone, transmite a vontade de ir até o Malauí para conhecê-la pessoalmente.

A África, um sonho antigo

Agora todos a chamam de "Mãe Rita". Antes da longa aventura africana, Rita trabalhou por por mais de dez anos em algumas estruturas públicas em Bergamo e Milão como enfermeira e educadora em uma creche. O amor pelas crianças sempre a caracterizou, desde que estudava na escola primária. Em 1974 decidiu partir para as missões através do Celim (Centro de Leigos Italianos para as Missões). Trabalhou dez anos em um hospital no Malauí como enfermeira na pediatria. Foi uma das primeiras missionárias leigas a chegar nestas montanhas. Na época era difusa a cólera, a malária, e muitos casos de lepra e nos anos Oitenta começaram os casos d AIDS, tudo sem medicamentos adequados e insuficientes. “Fazíamos as vacinas debaixo de um pé de manga – conta - acudindo os poucos órfãos que chegavam de seis vilarejos no hospital, em uma pequena estrutura cedida pelo bispo. Em 2002 o hospital diocesano fechou por falta de fundos. Morei em uma cabana por nove meses. Depois fui ao Brasil onde fiquei pouco tempo e à Costa do Marfim por três anos. Estava procurando o meu centro. Enfim descobri que o meu coração ficara no Malauí.

Crianças sozinhas encontradas até sob arbustos

Hoje Rita vive em Mangochi, no sul do Malauí, onde reestruturou e fundou o Alleluya Care Center, depois de ter vendido os bens que herdara de seus pais. "Os primeiros anos foram felizes, todas as nossas esperanças, todo o nosso amor, todas as nossas jovens energias lançadas no cuidado de crianças órfãs ou abandonadas, doentes e desnutridas. Não vamos à procura dos pobres porque eles estão fora de nossa casa. Os próprios familiares os trazem até nós. Ou os encontramos nos lugares mais impensáveis, à beira dos caminhos ou debaixo de arbustos. Nós cuidamos dessas crianças, e quando elas atingem a idade de três anos, as devolvemos aos seus parentes, se forem encontrados. Todos os meses – ela conta - vamos ver como eles estão, levando roupas e remédios. Se não encontramos ninguém mesmo, através dos serviços sociais, fazemos adoções às famílias interessadas. Em Bérgamo temos um, em Gênova outro, na Austrália temos cinco.

A história de Bakhita, parecia um coelho sob as plantas

Rita já salvou 2.500 crianças em todos esses anos. Recorda o caso de Bakhita. Nós a encontramos debaixo de um pé de banana. Corria o risco de ser morta porque parecia um coelho. Aos seis meses a levei para a Itália para uma operação no coração. Agora tem vinte anos, mora em Bérgamo, e nestes dias saiu do hospital depois de mais uma cirurgia. Mas pelo menos cresceu em um ambiente protegido – explica Rita – e tem uma família que adora, apesar das cicatrizes físicas. Uma outra história é a de um menino encontrado na rua, estava na calçada. Calculamos que tinha dois anos e pesava 4 quilos. Cuidamos dele e agora está muito bem e feliz, mas não sabemos quem é a mãe. Nós estamos entre Malauí e Moçambique, talvez ela tenha fugido para lá. Já fiz todas as assinalações, mas até agora não apareceu ninguém. Cuidaremos dele, aqui no Malauí já conseguimos adotar cinco crianças”.

Fui pobre, amo os pobres

Em 2017,  Rita conseguiu abrir uma creche para estas crianças sem pais. "Eu não queria fazer uma escola só para eles - esclarece - porque as crianças têm que interagir. Cheguei a ter 200 crianças e 50 órfãos. Infelizmente, aqui a mortalidade precoce é generalizada. "As mães, devido à fome, são anêmicas, por isso quando dão à luz muitas delas morrem", explica. "Acontece com frequência que homens e mulheres adoecem e morram de AIDS, deixando os seus filhos com os avós, que em muitos casos têm enormes dificuldades em cuidar deles, porque eles próprios devem ser cuidados. Nós estamos entre os pobres. Mas eu amo os pobres. Fui pobre e amo os pobres. E eu rezo sempre pelo Papa Francisco, que ama tanto os pobres. Eu gostaria muito de conhecê-lo, abraçá-lo, chorar com ele".

Que o novo Presidente dê justiça e reconciliação.

Alguns dias atrás foram feitas as eleições presidenciais no país que elegeram o líder da oposição Lazarus Chakwera. "Temos realmente que agradecer ao Espírito Santo que ajudou estas pessoas", disse Rita sobre a eleição, "muitos estavam cansados de serem enganados". O novo presidente não quer as separações norte, sul e centro. Todos, católicos, muçulmanos e protestantes, devem colaborar. Quer que todos nós sejamos Malauianos. Ele quer mais igualdade, paz e reconciliação. Acredito que ajudará também os pobres".

Apelo aos jovens para prosseguir o trabalho de Rita

"Depois de criar estas crianças, as separações dão tristeza, as lágrimas descem abundantes", diz Rita, enquanto nos envia as fotos desta preciosa obra, "mas devo deixá-los voltar aos seus povoados, quando for possível, porque essa é a sua realidade, as suas origens, o seu povo". Devemos ajudar estas crianças. Eles querem viver. Se Deus nos colocou aqui, há uma razão, que devemos dar esperança". Como a senhora lida com a solidão? "Muitas vezes a solidão toma conta de mim, mas eu digo: Mãe, Pai, dai-me a sua fé, a sua esperança e a sua caridade". E concluiu com um convite aos jovens: "Não tenham medo, se forem iluminados pelo espírito, doem-se com coragem, porém com segurança. Força."

 

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06 julho 2020, 11:32