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Violências inter-religiosas voltam a sacudir o Sri Lanka

Em decorrência dos atentados no Domingo de Páscoa, a violência inter-religiosa volta a sacudir o país asiático, dez anos após o fim da guerra civil, que durou 26 anos. O ódio disseminado pelas redes sociais - bloqueadas pelo governo - volta-se agora contra os muçulmanos, com a vandalização de mesquitas e destruição de casas e lojas.

Cidade do Vaticano

Dez anos após o fim da guerra civil no Sri Lanka (durou de 1983 a 2009),  anunciada em 18 de maio de 2009, os conflitos inter-religiosos voltam a sacudir o país asiático, como consequência dos ataques terroristas contra igrejas e hotéis no Domingo de Páscoa, que mataram mais de 250 pessoas e feriram mais de 500.

Ficamos surpresos, porque há dez anos que não acontecia algo assim”, disse o cardeal Ranjith ao Vatican News após os atentados suicidas em 21 de abril. “A situação era bastante tranquila e pacífica e os turistas estavam voltando ao país. A economia estava retomando caminho e tínhamos muitas esperanças. Este atentado é um pouco estranho: havia algumas tensões entre as comunidades islâmicas e a da maioria [budistas], mas não creio que fosse tão dramática, a ponto de causar um atentado deste tipo. Por trás deste ataque deve ter alguma matriz internacional.”

O purpurado cingalês havia exortado os cristãos a não se vingarem contra a minoria muçulmana do país, com quem mantinham boa convivência, ao mesmo tempo que cobrava das autoridades uma investigação completa e a prisão dos extremistas.

Redes sociais

 

Mas desde então, um ódio crescente contra a comunidade muçulmana começou a se propagar, especialmente através das redes sociais, a ponto de o governo na última terça-feira ter bloqueado o funcionamento do Twitter, Facebook,  WhatsApp, YouTube e Instagram, para tentar impedir a disseminação de mensagens que incitam à violência.

Toque de recolher após ataques a mesquitas e propriedades de muçulmanos

 

Também na terça-feira havia sido decretado o toque de recolher pela segunda noite consecutiva, depois de um muçulmano de 45 anos ter sido morto em sua carpintaria por manifestantes armados de espadas. A polícia informou que 13 pessoas foram presas, incluindo Amith Weerasinghe, um homem da comunidade cingalesa budista.

A violência irrompeu na noite de segunda-feira, com multidões furiosas realizando ataques incendiários contra propriedades de muçulmanos e 2.000 pessoas vandalizando mesquitas.  “Os agressores atacaram sistematicamente as mesquitas por dois dias", disseram clérigos muçulmanos locais à AFP. Na cidade de Kinyama, duas mesquitas foram destruídas.

Em outro local ao norte de Colombo, manifestantes atearam fogo em lojas de propriedade de muçulmanos, vandalizaram casas e quebraram janelas, móveis e acessórios dentro de várias mesquitas.

No distrito vizinho de Gampaha, homens em motocicletas lideraram ataques incendiários na cidade de Minuwangoda, a 45 quilômetros ao norte de Colombo, disseram moradores locais à AFP.

"Eles eram de fora da cidade", disse um proprietário de uma loja de produtos eletrônicos por telefone. "Depois que eles começaram a destruir lojas muçulmanas e jogar bombas de gasolina, os moradores se juntaram a eles. E  a polícia não fez nada".

Ele acrescentou que a polícia e as forças de segurança pareciam estar sobrecarregadas e que, quando as tropas dispararam para o ar para dispersar a multidão,  mas era tarde demais.

Imagens que circulam pelas redes sociais mostram lojas em chamas enquanto multidões armadas com paus e pedras percorriam as ruas, atacando e destruindo propriedade de muçulmanos.

"As forças de segurança estão ajudando a polícia, que recebeu ordens para usar a força máxima para conter a violência", disse Ruwan Gunasekera, porta-voz da polícia.

Se nos perdermos na violência, perderemos o país

 

Em um discurso dirigido à nação na noite de segunda-feira, o primeiro-ministro Ranil Wickremesinghe alertou que a agitação dificultaria as investigações sobre os ataques que tiveram como alvo três igrejas e três hotéis de luxo no Domingo de Páscoa.

Em outro pronunciamento na TV, o chefe de polícia Chandana Wickramaratne alertou sobre uma ação severa contra os desordeiros e disse que os policiais receberam ordens para usar a força máxima.

A lenda do críquete do Sri Lanka, Kumar Sangakkara, estava entre os que pediram calma, antes de twittar: "PARE. RESPIRE. PENSE. ABRA SEUS OLHOS. Se nos perdermos em violência, racismo, vingança e ódio, perderemos nosso país".

Crescente influência prejudicial de concepções nacionalistas e extremistas na região asiática

 

"O Sri Lanka é uma sociedade pluralista. Ser do Sri Lanka significa ser indiferentemente hinduísta, cristão, muçulmano ou budista", salienta o Conselheiro especial para a prevenção de genocídio da ONU, Adama Dieng, que após a retomada da violência no país fez um alerta contra a crescente influência prejudicial de concepções nacionalistas e extremistas na região asiática, que colocam as minorias religiosas em risco". Em particular, a representante da ONU destacou o aumento de ataques contra comunidades muçulmanas e cristãs, em um país predominantemente budista.

Os muçulmanos representam cerca de 10% da população de maioria budista do Sri Lanka e os cristãos cerca de 7,6%.

Os numerosos ataques contra mesquitas e lojas de propriedades de muçulmanos, surgidos após os atentados no Domingo de Páscoa, alerta Adama Dieng, podem levar o país de volta a uma situação que parecia superada há anos.

“Se a recente onda de violência não for devidamente combatida, é provável que aumente mais". Neste sentido, Dieng convidou o governo a estar vigilante e fazer de modo que os perpetradores dessa violência sejam presos e condenados.

"Não é tolerável -  acrescentou - permitir que preconceito e ódio se espalhe entre a população. É necessário pôr termo às discriminações que causam intolerância e violência religiosa. É necessário trabalhar para promover a harmonia e a inclusão inter-religiosa. Todas as comunidades religiosas têm direito à sua identidade e ao livre exercício religioso e viver em paz no Sri Lanka, como reconhecido pela Constituição do país".

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16 maio 2019, 12:54