Manifestação nas ruas de Argel Manifestação nas ruas de Argel 

Bispo emérito da Argélia: mais comprometimento com nossos irmãos muçulmanos

A Argélia é o único estado muçulmano que permitiu a beatificação de 19 mártires cristãos, religiosos e religiosas de várias congregações, ocorrida na localidade de Orã em 8 de dezembro do ano passado. Entrevista com o arcebispo emérito de Argel, Dom Henri Teissier

Cidade do Vaticano

“O esforço para entender a problemática do islã é necessário, porém mais importante do que isso é a convivência entre os discípulos do Evangelho e do Alcorão”. São palavras de Dom Henri Teissier, arcebispo emérito de Argel, que morou na Argélia nos anos 90, durante a sangrenta guerra civil, com o terrorismo fundamentalista, que causou a morte de dezenas de milhares de pessoas entre cristãos e muçulmanos.

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Hoje, depois de vinte anos, Dom Henri fala da nova realidade da Argélia, que nestes meses está passando por uma revolução pacífica, com a população nas ruas para pedir uma radical mudança política, manifestações que continuam apesar da renúncia do presidente Abdelaziz Bouteflika.

A Argélia é o único estado muçulmano que permitiu a beatificação de 19 mártires cristãos, religiosos e religiosas de várias congregações, ocorrida na localidade de Orã em 8 de dezembro do ano passado.

Dom Henri Teissier depois da participação em um seminário em Roma intitulado “Muçulmanos e cristãos na Argélia: experiências e esperanças compartilhadas” deu seu testemunho ao Vatican News:

Dom Henri Teissier: Para nós foi extraordinário que o Estado argelino tivesse aprovado a realização da beatificação na Argélia, porque o Estado tinha proibido a volta àquele período de violência que causou a morte de quase 200 mil pessoas. Queria que aqueles 10 anos entre 1990 e 2000 fossem esquecidos. Porém, os bispos disseram ao Governo argelino que o objetivo não era recordar a violência, mas a fidelidade das vítimas, que mesmo podendo deixar o país no qual mais tarde foram assassinadas, escolheram ficar ao lado do povo argelino. Trabalhavam nos bairros pobres, nos momentos de perigo, não abandonavam sua gente, não quiseram fazer isso. Há os que decidiram ir embora, nós deixamos a cada um a liberdade de escolha, porém a grande maioria dos sacerdotes, dos religioso e religiosas, também de leigos missionários, decidiram ficar ao lado dos seus irmãos argelinos.

O senhor é testemunha há muitos anos de muitas experiências de encontro entre a comuniadade cristã e a população muçulmana, atualmente, como está o caminho do diálogo e do encontro?

Teissier: Sabe-se que hoje no mundo muçulmano há várias correntes, entre as quais, algumas que não aceitam o diálogo ou o encontro. Mas nós, naturalmente, temos relações com os que aceitam, e juntos trabalhamos em vários projetos no plano social e humanitário. Por exemplo, trabalhamos para as pessoas com deficiências, que não implica apenas um serviço, mas uma reflexão sobre a vida humana, sobre o respeito das crianças que não têm as mesmas possibilidades dos outros, e assim por diante. Fazemos o mesmo em muitos campos com a Cáritas, e isso significa que na nossa igreja a maioria dos que trabalham conosco são muçulmanos porque os cristãos não são numerosos, e porque há muçulmanos que aceitam, que querem trabalhar conosco. Este é um sinal positivo, considerando que há lugares nos quais entre os cristãos e muçulmanos há muita violência.

As agitações sociais que ocorreram no seu país poderiam criar novamente alguma situação de perigo no âmbito das relações entre cristãos e muçulmanos?

Teissier: De modo geral não, porque os que fazem parte destas manifestações dizem que querem criar uma Nação nova na qual todos saibam que são argelinos, porém sem fazer distinções entre árabes e os berberes ou entre a forma de islã escolhido, etc. Querem viver no respeito recíproco, esperamos que o resultado destas mudanças da sociedade possa ser também um novo passo para esta conquista.

Há alguma preocupação particular neste momento?

Teissier: Encontrar uma solução política, porque naturalmente agora se fazem manifestações pacíficas, porém é necessário que se encontre uma solução, escolhendo pessoas que possam entrar em discussão com o poder atual. Para nós, como cristãos, o que mais esperamos é um comprometimento mais amplo possível com os nossos irmãos muçulmanos em todos os âmbitos. Por exemplo, há muitos cárceres nos quais visitamos os cristãos detidos, e isso dá origem a uma relação muito positiva entre nós, no campo cultural. Queremos ampliar as relações com os muçulmanos que aceitam trabalhar conosco que procuram entender o nosso projeto e querem ficar conosco.

 

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17 maio 2019, 13:40