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Irmã Maria Inês Ribeiro Irmã Maria Inês Ribeiro 

Irmã Maria Inês Ribeiro: o sentido da Vida Consagrada

A presidente da Conferência dos Religiosos do Brasil: “ser profecia, presença, curar, redimir, salvar, libertar, fora disso não há sentido para a Vida Consagrada”. No dia 2 de fevereiro a Igreja comemora o Dia da Vida Consagrada.

Padre Modino – CELAM

Como uma “experiência de uma escolha de Deus”, assim vê a irmã Maria Inês Ribeiro sua vocação. A presidente da Conferência dos Religiosos do Brasil, no contexto do Dia da Vida Religiosa, reflete sobre a vida consagrada num momento caótico.

A irmã Maria Inês é consciente dos desafios que enfrenta a Vida Religiosa, insistindo na “abertura onde a vida realmente mais necessita, onde realmente precisa da presença salvadora, redentora de Deus”. Por isso, ela destaca que a necessidade “de ser profecia, de ser presença, de curar, de redimir, de salvar, de libertar, fora disso não há sentido para a Vida Consagrada”.

Diante disso se faz necessário sair do comodismo e buscar o caminho para poder avançar, insiste a religiosa. Também faz um chamado a se envolver no processo sinodal do Sínodo sobre a Sinodalidade, lançando uma mensagem de coragem para descobrir “como ser resposta, como ser consagrados no mundo de hoje”. 

No dia 2 de fevereiro a Igreja comemora o Dia da Vida Consagrada, um momento que representa uma recordação especial para os religiosos e as religiosas. O que significa ser religioso, religiosa, hoje no Brasil?

A vocação religiosa significa um chamado de Deus, a nossa fé nos coloca muito claro que é um chamado de Deus, uma experiência que fazemos do desejo de doar nossa vida aos outros, de uma experiência de fé realmente. Quando eu olho a minha história desde muito criança, adolescente, o desejo que eu tinha era exatamente colocar a minha vida ao serviço dos outros, ser útil, ser servidora, ser servidora daqueles que precisavam.

Era muito presente na minha vida, e para muitos de nós também essa experiência de uma escolha de Deus, de um chamado de Deus, para estar a serviço, estar realmente como pessoa escolhida, destinada, reservada. O religioso, a religiosa, é aquele que se reserva para o Senhor e está ao serviço das obras do Reino. Isso é ser religioso hoje, religiosa hoje.

A senhora fala de estar ao serviço, ser presença, uma presença que deve ser para todas as pessoas. Mas diante da realidade que o mundo e o Brasil estão vivendo hoje, a vida religiosa hoje tem um desafio especial a ser presença nas periferias, na vida dos vulneráveis?

Nós estamos vivendo um momento caótico, um momento de caos, de grande confusão e desordem em nossa humanidade, em nosso Brasil. E essa situação afeta profundamente, tem consequências pastorais, tem consequências espirituais, institucionais, econômicas, sociais, e que também nos deixam como consagrados e consagradas, muito perplexos. Essa situação de pandemia nos colocou a todos meio acomodados, e aqueles que são mais sensíveis, nós ficamos meio vislumbrados e quase sem forças para enfrentar a situação.

A vida religiosa hoje está muito desafiada, com os números pequenos que todos temos, diante de tantas situações, envelhecimento, a falta de vocações. Nos deixa assim porque o lugar da vida consagrada, por todas as experiências que nós vivemos, os nossos fundadores e fundadoras, todos eles iniciaram com essa abertura aonde a vida realmente mais necessita, aonde realmente precisa da presença salvadora, redentora de Deus.

Nossa fé nos coloca onde o mundo precisa, nos atira, como foi a presença de Deus no Êxodo, que está vendo esse povo que sofre. Eu vi, e para muitos de nós é também a mesma experiência, nós estamos vendo. E temos, graças a Deus, muitas pessoas empenhadas. Cresce entre nós um desejo muito forte, estamos preparando a assembleia nacional da CRB e nós estamos vendo que precisamos que ressignificar a nossa Vida Religiosa. Não vamos salvar todas as situações do Brasil, mas nós temos que estar muito atentos, muito atentas, aonde realmente é o lugar da Vida Consagrada, é ali que nós devemos responder aos clamores. Se não, não tem sentido a nossa Vida Consagrada.

Aí é que carece de olharmos com mais profundidade, por que é que não atraímos mais vocações, porque estamos fugindo a nosso carisma, estamos fugindo a nossa presença profética. Porque comunidades, grupos, congregações, novos grupos que estão surgindo com essa atenção aos mais pobres, pequenos, periferias, eles estão rodeados de pessoas que querem somar com eles, somar com elas, isto é muito visível. Realmente, o lugar da Vida Consagrada é de ser profecia, de ser presença, de curar, de redimir, de salvar, de libertar, fora disso não há sentido para a Vida Consagrada.

A senhora fala de certa acomodação da Vida Religiosa neste tempo de pandemia. De cara ao futuro, quais são os desafios e os novos caminhos que a pandemia está colocando para a Vida Religiosa no Brasil?

A gente sente uma certa acomodação, primeiro é o próprio receio, porque nós temos na Vida Consagrada uma porcentagem mais numerosa de pessoas mais vividas, de pessoas envelhecidas. O desafio está em redefinir, rever nossas obras, atividades, carismas. Nós vamos viver daqui para frente como Vida Consagrada um desafio muito grande, não só em desaparecimento de grupos, com muitos grupos em Brasil que estão terminando seus dias. Outros, mesmo pequenos, estão entusiasmados no sentido de retomar o carisma, de rever realmente a sua presença, esse é o grande desafio para a Vida Consagrada no momento.

Alguns acham que é um fenômeno passageiro, outros estão empenhados e estão realmente querendo resinificar para sermos sinais do Evangelho, da presença de Cristo no mundo, do serviço apostólico, significativo para os irmãos e irmãs que mais precisam de nós. O problema que nós vemos é que não está só no individuo, está na instituição, nós estamos vendo as vezes muitas das nossas instituições, ainda muito preocupadas com a manutenção das obras. Obras educacionais, mas muitas estão perdendo o chão pela concorrência de inúmeras escolas particulares.

Há pouco tempo um bispo me disse de sua preocupação porque na sua diocese tinham fechado duas escolas católicas. A resposta que eu dei para o bispo foi que essas irmãs poderiam ir para a periferia e ver as crianças que estão sem escola, talvez recomeçar lá, como fez a sua fundadora, como fez o seu fundador. E vai vir os recursos para recomeçar com aquelas poucas crianças que estão sem escola. Esse é o grande desafio, mas qual a congregação que vai ter a coragem de recomeçar tudo de novo, ou de ver os sinais de Deus no hoje.

A redenção acontece na nossa história, no nosso dia a dia, no nosso cotidiano. O Senhor quer redimir, quer salvar, quer continuar sua missão por nós hoje, agora, onde nós estamos. Então um grande desafio para a Vida Consagrada é justamente, e vamos trabalhar na nossa assembleia, é a ressignificação, a redefinição. Dar uma recuadinha para retomar e ver como avançar. E aqueles que não acreditam nessa ressignificação, estão ainda mais fadados a poder pendurar as chuteiras, fechar as portas, e dizer nada mais temos a fazer.

A senhora fala sobre desafios, sobre um número cada vez menor na Vida Religiosa, que por outro lado é algo que está presente na Igreja como um todo. Diante dessa realidade, o Papa Francisco nos chama a caminhar juntos, a ser uma Igreja sinodal, uma reflexão que está presente hoje na vida do mundo e também do Brasil. Como a Vida Religiosa está assumindo os desafios que o Papa Francisco está nos colocando diante da preparação ao Sínodo?

A gente está preparando, mesmo que nós estamos incentivando que os religiosos e religiosas participem do processo de escutas em suas paróquias e dioceses, conforme às iniciativas para a escuta. A CNBB é que vai reunir todas as respostas, as contribuições da Igreja no Brasil, nós não vamos oferecer como CRB, como Vida Religiosa, alguma conclusão escrita da nossa parte, mas nós pensamos como fizemos para a Assembleia Eclesial, reunir grupos, os superiores maiores, os formandos, os formadores, para incentivar e refletir sobre a realidade desse caminhar juntos como Igreja.

Nós queremos porque ainda percebemos que estamos muito encerrados em nossas instituições, em nossos conventos ainda. Por todo o caminhar do Vaticano II ainda temos congregações voltadas para o seu interior. A presença nossa, o trabalho nosso como Conferência é investir mais nesta reflexão, neste caminhar juntos. A presença da Vida Religiosa numa paróquia, numa diocese, numa periferia, ela é significativa. Tem que haver uma abertura dos dois lados, se uma comunidade religiosa não se coloca a disposição, à escuta, mas por outro lado a acolhida dos párocos para esse caminhar juntos, de servir juntos na caminhada pastoral.

Nós estamos pensando, para depois do período das férias, verificar juntos como vamos fazer para motivar nossa Vida Consagrada para uma participação maior nesse processo sinodal, independente do que vai acontecer lá em 2023. Nós, como Brasil, temos que retomar com muita seriedade os desafios apontados pela Assembleia Eclesial, e tem que ser de uma forma institucional. Quanto mais nós estarmos em sintonia com todo esse processo sinodal que América Latina já tem feito, e que coroou com a Assembleia Eclesial, vai dar um grande apoio à preparação do Sínodo.

Nós não vamos participar do processo porque precisa realizar o Sínodo, mas porque participar do processo já significa estarmos nesse caminho de crescimento como uma Igreja sinodal. É um sonho nosso, realmente termos uma Igreja sinodal, temos sofrido com a formação do clero, como está distante dessa Igreja sinodal. Por onde caminha realmente a nossa juventude que prepara para o sacerdócio? A própria juventude da Vida Consagrada, por onde ela está indo?

Qual é sua mensagem para a Vida Religiosa no Brasil diante da comemoração do Dia da Vida Consagrada?

A mensagem que eu deixo para a Vida Consagrada, é a mensagem do próprio Jesus, que Ele diz para nós: “coragem, eu venci o mundo”. Então, nós podemos dizer para a Vida Consagrada, coragem, nós vamos a vencer, é um período, uma etapa. Porque nós percebemos que a Vida Consagrada, ela passa por ciclos, teve o ciclo dos monges do deserto, depois tivemos o ciclo das ordens mendicantes, depois vieram as comunidades apostólicas.

Agora nós vivemos um ciclo diferente, que é enriquecido, nós temos a experiência do deserto, como da periferia, e de outras situações, mas temos que encontrar hoje, num tempo de grandes mudanças, como ser resposta, como ser consagrados no mundo de hoje. É o Senhor que vai nos fortalecer nessa descoberta, nessa fidelidade criativa. Se formos fieis, com Jesus entre nós, nós teremos criatividade e conseguiremos dar nossa resposta.

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01 fevereiro 2022, 13:07