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Mais de 530 mil deslocados internos devidos a ataques e violência em Cabo Delgado (norte de Moçambique) Mais de 530 mil deslocados internos devidos a ataques e violência em Cabo Delgado (norte de Moçambique) 

Moçambique. Crise em Cabo Delgado: alarme das Igrejas da África Austral e Oriental

“A insurreição em Cabo Delgado não é apenas um problema moçambicano: é uma emergência regional, e portanto um fardo para toda a África que não pode ser ignorado a nível global” - é o alerta lançado pela Associação dos Conselhos das Igrejas da África Austral (FOCCISA, sigla em inglês), que apela para acções urgentes em apoio à população “terrorizada” pelas terríveis violências.

Cidade do Vaticano

A província de Cabo Delgado (norte de Moçambique) é, desde 2017, palco de uma sangrenta insurreição armada de grupos jihadistas ligados ao chamado Estado Islâmico, cujo objectivo é fundar um califado governado pela sharia, a lei islâmica. Mais de 2 mil morreram até ao momento e pelo menos 530 mil são deslocados internos devido ao conflito. Um drama trazido à atenção da comunidade internacional pelo então Bispo de Pemba, D. Luiz Fernando Lisboa, agora bispo de Cachoeiro de Itapemirim, no Brasil, e que por várias vezes mereceu a atenção do Papa Francisco.

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Numa declaração publicada na quinta-feira (4/03) no final de uma reunião dos Secretários-gerais dos Conselhos nacionais das Igrejas membros da Associação, a FOCCISA informou ter tomado conhecimento de "ataques brutais" perpetrados pelos rebeldes contra a população civil. Entre eles "decapitações de pessoas e a tomada e tráfico de partes de corpos humanos", saques, incêndios, execuções sumárias e inúmeras violações dos direitos humanos que estão a causar um êxodo maciço da população local, 10% dos quais são agora deslocados internos.

Apelo às Autoridades moçambicanas e organizações internacionais

Neste contexto dramático, as Igrejas da África Austral e Oriental lançam, pois, um apelo urgente às autoridades moçambicanas e às organizações internacionais para que parem a violência e restaurem a segurança na província. Em primeiro lugar, as Igrejas se dirigem ao Governo de Maputo para que tenha a coragem de agir com medidas adequadas à gravidade da situação em vez de "minimizar" a crise reduzindo-a a uma questão de criminalidade e, portanto, de investigar sobre os "factores sociais e económicos que fazem de Cabo Delgado um terreno fértil e maduro para este tipo de insurreição”. A província é, de facto, uma região pobre em infra-estruturas, serviços primários, e com a mais alta taxa de analfabetismo do País, embora rica em matérias-primas, e com enormes depósitos de gás natural, minas de grafite, rubis e outros recursos cuja exploração teve início apenas recentemente, mas com poucos benefícios para a população local.

Trabalhar juntos para melhorar qualidade de vida das comunidades

Através da análise desta situação - afirmam os líderes cristãos africanos - o Governo e o povo moçambicano “podem trabalhar juntos para a reconstrução da sua sociedade e trabalhar com as comunidades afectadas para melhorar a sua qualidade de vida”. Para esta finalidade, eles solicitam igualmente o apoio dos Estados da União Africana (UA) e em particular dos membros da Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral (SADC): "Pedimos aos países e Governos da SADC para que respondam urgentemente à insurreição em Moçambique, quer individual quer colectivamente porque, na realidade, não se trata apenas de uma crise moçambicana, e muito em breve ela vai envolver toda a região com um impacto material e económico na vida e na subsistência dos pobres da região”, adverte a FOCCISA.

Empresas devem contribuir na busca de soluções duradouras

Os líderes cristãos também se dirigem aos actores económicos, em particular às empresas que actuam na extração de recursos naturais da província que - afirmam - devem “contribuir na busca de soluções duradouras e não se limitar a garantir a segurança das suas actividades. Fazemos apelo a todos os sectores para que cumpram o seu papel na hora da necessidade”. Os líderes cristãos pedem também às operadoras das redes de telefonia móvel para que ofereçam chamadas gratuitas ou pelo menos parte delas para que as pessoas possam pedir ajuda. Em particular – dizem eles - é necessário socorrer as vítimas mais fragilizadas: “crianças, mães, pessoas com deficiência, doentes crónicos e idosos; para não falarmos das vítimas da Covid-19, que lutam para respirar”. Por fim, o apelo às Nações Unidas para que acompanhem de perto a crise em Moçambique e todas as crises que ameaçam hoje o Continente africano "antes que seja demasiado tarde". Quanto a elas, conclui a declaração, as Igrejas cristãs da África Austral vão se unir em oração com o Conselho das Igrejas de Moçambique para invocar o dom da paz nestas terras.

Papa Francisco fez vários apelos por Cabo Delgado

Fundada em 1980, a FOCCISA é membro do Conselho Mundial das Igrejas (WCC) e inclui os Conselhos Nacionais das Igrejas de 12 Países da África Austral e Oriental: Tanzânia, Angola, Namíbia, Zâmbia, eSwatini (antiga Suazilândia), Malawi, Quénia, Zimbabwe, Botswana , Lesoto, Moçambique e África do Sul, de que também é membro a Conferência Episcopal Sul-Africana.

Recorde-se que o Papa Francisco fez vários apelos por Cabo Delgado. O último em ordem cronológica foi o que o Santo Padre lançou no dia 25 de dezembro, na Mensagem Urbi et Orbi do dia de Natal. A crise na província moçambicana de Cabo Delgado foi novamente recordada pelo Pontífice também no tradicional discurso do início do ano aos membros do Corpo Diplomático acreditado junto da Santa Sé, no passado dia 8 de fevereiro.

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09 março 2021, 12:25