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Bispos do Congo pedem um suplemento de patriotismo

Bispos do Congo preocupados com a crise sociopolítica e económica no país, apelam ao diálogo, à ética e à repatriação dos bens colocados fora do país.

Dulce Araújo - Cidade do Vaticano

Os Bispos da República do Congo estão preocupados com a crise socio-política e económica que o país está a atravessar desde há pelo menos três anos. Então, fiéis à missão da Igreja de acompanhar os  cristãos para que sejam sal da terra e luz do mundo, reuniram-se em Assembleia nos dias 9 e 10 deste mês de maio, analisaram a situação e emitiram uma mensagem ao Povo de Deus e pessoas de boa vontade. Nela partilham as suas convicções quanto às causas profundas da crise e apontam algumas vias de solução.

Responsabilidade do Governo

Antes de mais afirmam estar profundamente convictos de que essa crise é devida ao facto de o “governo e todos aqueles que têm o dever de decidir", terem ignorado a sua mensagem de Natal 2014 em que sublinhavam que “num regime democrático, nunca nenhuma reforma que suscita fortes tensões e oposições,  beneficiou o povo” . Por conseguinte – escreviam na altura -  uma mudança da Constituição na divisão só poderia “por em perigo a paz social”. Por isso, apelavam “ao futuro Presidente da Republica a empenhar-se para salvar a nação, encetando uma nova forma de agir”. O mesmo já tinha sido afirmado numa anterior mensagem sobre os falsos valores.

Crise do Pool

Referindo-se depois à região de Pool, um dos dez departamentos do país, situado a sudeste e onde se tem havido conflitos sangrentos, os Bispos afirmam que, infelizmente, não é a primeira vez que se verifica uma guerra no Pool. “Desde 1998, esse Departamento é regulamente sacudido por crises e conflitos armados, que de cada vez se concluem com acordos de paz  e de cessação das hostilidades, programas de desmobilização e reinserção dos ex-combatentes. Mas de cada vez, as verdadeiras vítimas que são as populações civis não foram tidas em conta”. Não bastam acordos de paz no papel. É preciso ir mais e exigir a verdade sobre essa crise recorrente longe – frisam  os bispos. “O Povo tem direito de saber o que se passou: as causas e as consequências, mas sobretudo as responsabilidades de uns e de outros. Os mortos e as destruições nesse Departamento clamam por justiça e reparação. Só assim poderá haver uma verdadeira reconciliação e uma saída dessa crise multiforme (…)” – escrevem.  

Recessão económica

No que toca à crise económica, os bispos congoleses perguntam-se se a recessão económica no país depois dos faustos anos do boom do petróleo não é facilmente atribuída à queda do preço do petróleo no mercado internacional? E vão ainda mais longe:

“Como explicar a nossa falta actual de recursos e o nosso endividamento excessivo, depois de dez anos de embelezamento, durante os quais o país arrecadou uma riqueza enorme e foi mesmo criado um fundo para as gerações vindouras? Como compreender, por exemplo, que no momento em que o Governo afirmou ter uma conta no Banco Exim, na China, para pagar as nossas infra-estruturas, a dívida em relação à China seja colossal: 40% do montante total da dívida?”

Os bispos interrogam-se também sobre as eternas práticas de pré-financiamento petrolífero com os traders, que têm contribuído também para aumentar o endividamento. Porque é que se recorreu a essa prática, quando o país dispunha de meios suficientes para financiar o seu desenvolvimento? – perguntam-se. E continuam:

Ética no comércio das matérias primas

Para quando a ética no comercio das nossas matérias primas, mas também nas montagens financeiras e as dívidas que são contraídas em nome do País? Não é por ventura chegado o momento, para os países donde vêm as empresas especializadas na exploração e comercio das nossas matérias primas,  de vigiar sobre as práticas de corrupção dos seus cidadãos que tanto arruínam o nosso país?”

Devido à corrupção, à concussão e ao furto – sublinham os prelados do Congo – hoje o país é incapaz de pagar os salários dos trabalhadores, as pensões, as bolsas de estudo, cuidar dos hospitais (aumenta a mortalidade e o suicídio) das escolas, uma refeição por dia (que se tinha tornado a regra para as famílias), agora é um privilegio porque os preços dos géneros alimentícios não cessa de aumentar, enquanto desce o preço da cerveja. Ao desemprego dos jovens que já era endémico, ajunta-se agora o dos que perdem o trabalho devido à recessão económica.

Interpelação das consciências

Os bispos sentem-se interpelados por esta situação, e sublinham que há que haver coragem de falar das desigualdades sociais, da corrupção, das fraquezas da justiça, e dizem esperar resultados concretos da proposta dos partidos da maioria presidencial de fazer com que os fundos roubados ao Povo e depositados lá fora sejam devolvidos ao país. E para isso, apelam à coragem e lucidez do Presidente da República que pode, nisto, contar com o apoio dos Bispos.

E no caso de um eventual contrato entre o FMI e o Congo, os bispos recomendam que a luta contra a corrupção, a concussão e a promoção da boa governação não sejam tocadas. E que as instituições encarregadas de lutar contra esse flagelo no Congo trabalhem mais pela erradicação do fenómeno.

Diálogo politico para alentar a tesão no país

Com o objectivo de alentar a tensão no país, os bispos propõem um amplo diálogo político entre o governo e as pessoas em lugares de responsabilidade, para discutir o modelo político e institucional que se quer para o país, modelos apoiados em valores morais com vista na estabilidade política, numa justiça équa e independente. Neste quadro solicitam a libertação dos presos políticos.

Propõem também um trabalho juntamente com a sociedade civil representativa para adopção de um novo sistema eleitoral; uma reflexão sobre a forma de resolver definitivamente a crise no Departamento de Pool, com base na verdade, reparação e reconciliação; fazer uma audição sobre a dívida do Congo e sobre todos os projectos realizados, nomeadamente no quadro do acordo de cooperação com a China, assim como também os pre-financiamentos petrolífereos e a sua utilização.

A todos aqueles que se apoderaram de dinheiro público, os Bispos pedem a restituição ao Congo; pedem também a criação de um corpo independente de magistrados eleitos pelos seus pares e com autoridade moral para reprimir a corrupção. Querem também a criação de um corpo de Auditores Gerais, eleitos por dois terços dos deputados parlamentares e com um mandato de 15 anos não renovável.

Aos governos dos países do norte do mundo

Aos governantes dos países do norte do mundo, os bispos pedem para ajudarem os congoleses a recuperar o dinheiro guardado impunemente nesses países e que pode servir à causa do desenvolvimento do Congo:

Aos fiéis leigos e pessoas de boa vontade

A Conferencia Episcopal do Congo convida os fieis leigos e pessoas de boa vontade a se empenharem como cidadãos na construção e consolidação da democracia e o estado de direito, acompanhando as políticas públicas, observando as eleições, recusando e combatendo a corrupção: “Não tenhais medo de ir ao encontro dos outros, de discutir com respeito e tolerância sobre o futuro do nosso país” – recomendam-lhes.

Às Igrejas irmãs do norte

Os bispos pedem às Igrejas irmãs dos países do norte do mundo para fazerem presente esta mensagem aos seus respectivos Governos a fim de que os fundos desviados do Congo sejam restituídos às populações congolesas.

Aos jovens

Finalmente, aos jovens os prelados congoleses recomendam que não esperem que tudo lhes venha do “Estado providencia”, mas a sem empenharem com rigor nos estudos, no trabalho produtivo.

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15 maio 2018, 15:42